Cerco às doações

Brasília - A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou ontem pela proibição das doações de empresas e partidos políticos e candidatos em campanha, o que poderá reduzir drasticamente os custos oficiais das eleições. Embora a maioria já esteja assegurada (6 a 1 entre 11minutos), o ministro Gilmar Mendes pediu vista, adiando a conclusão do julgamento. Pelo regimento interno, Gilmar teria duas sessões para devolver o processo, mas esse prazo nunca é cumprido, e a mudança pode não valer para a eleição deste ano.

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado fez ontem esforço no mesmo sentido: aprovou projeto de lei, em caráter terminativo, que põe fim às doações eleitorais de empresas. Se não houver recursos para o plenário, o projeto será aprovado em tempo hábil para vigorar nas eleições de outubro se os parlamentares conseguirem priorizar o tema.

O julgamento do STF começou em dezembro do ano passado e foi interrompido quando havia quatro votos contrários a doações de empresas. A discussão foi retomada ontem com o voto de Teori Zavascki, que defendeu a continuidade da norma atual, que permite a participação financeira de pessoas jurídicas nas campanhas. Até agora, se manifestaram contra as doações de empresas os ministros: Luiz Fux, relator do processo, Joaquim Barbosa, presidente do tribunal;Dias Toffoli, Luiz Roberto Barroso, Marco Aurélio Mello, que também é presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e Ricardo Lewanndoviski. Antes de pedir vista, Gilmar Mendes deu a entender que voltará como Teori Zavascki.

A polêmica foi suscitada por Ação Direta de Inconstitucionalidade da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que questiona a parte da legislação eleitoral que dá as pessoas jurídicas o direito de doar aos candidatos os valores correspondentes a até 2% do faturamento bruto do ano anterior ao da eleição. A ação também quer derrubar o dispositivo que autoriza pessoas físicas a doarem até 10% de deus rendimentos. Para a OAB, OTSE precisa limitar um valor numérico como teto das contribuições de pessoas naturais, e não percentual.

A única parte da lei que não foi questionada é o Fundo Partidário, que financia parte das atividades dos partidos com dinheiro público. Dos ministros que votaram pelo fim das doações de empresas, apenas Marco Aurélio negou o pedido referente às pessoas físicas. Ele também foi o único a deixar claro que a regra já teria validade para este ano, se o julgamento for concluído antes das eleições. O começo da vigência da norma será definido pelos ministros ao fim do julgamento.

- As pessoas jurídicas não votam e não podem ser eleitas. Daí porque não há a menor razão de existir participação no processo eleitoral. Elas defendem interesses materiais, incompatíveis com a aspiração de aprimorar o bem comum que promana do somatório dos votos individuais dos cidadãos - disse Lewandoviski.

Para Marco Aurélio, presidente do TSE, a influência excessiva do dinheiro nas campanhas promove desigualdade. Ele conclui que, por meio de doações, as empresas acabam ditando, indiretamente, os rumos políticos do país.

- O poder financeiro acaba tendo influência negativa nas decisões políticas do país. O valor político é substituído por meio de ações puramente pragmáticas, modela as decisões de governo e as políticas públicas prioritárias, além de contribuir para a debilidade ideológica de nosso sistema partidário - afirmou.

Para Teori Zavascki, proibir as empresas de contribuir com as campanhas não vai diminuir a corrupção, porque serão encontradas formas ilegais de financiamento para burlar a lei. Ele defende a limitação dos valores de doações, em vez do banimento delas:

- O antídoto para gastos excessivos de campanha eleitoral não é declarar a inconstitucionalidade de doações. A solução mais plausível será a imposição de limites de gastos.

Embora tenha perdido vista sem votar oficialmente, Gilmar Mendes deu sinais de que concorda com Zavaski. Ele explicou que os partidos grandes, que já tem recursos disponíveis só precisarão arranjar pessoas que fizeram as doações. Seria uma forma de driblar formalmente o banimento das doações de empresas.

- A exigência de que haja apenas a participação de cidadãos no financiamento não vai resolver logo a questão. Os partidos que estão no poder e que já tem recursos só precisaram de amsi algumas centenas de milhares de CPFs para novas distribuições. Certamente haverá pessoas pobres que doarão seu salário, porque receberão dinheiro para isso. Basta ver o fenômeno da doação para saber como isso opera. Os partidos que tiverem base de raiz vão operar com essa base lógica e já operam - afirmou.

Mesmo com o voto já expresso no ano passado, Fuz e Barroso reforçaram seus pontos de vista na sessão de ontem. Fux ressaltou que a participação de empresas no processo eleitoral não é ideológica, já que elas muitas vezes contribuem com partidos de bandeiras opostas. Barroso voltou a criticar o modelo eleitoral vigente:

- Do modo como o modelo é estruturado, não se consegue atrair para a política nenhuma nova vocação. O ingresso na política se dá ou de forma hereditária ou mediante compromisso com patrocinador. Vivo a crença de que faz parte do meu papel condenar um modelo que arruína a médio e longo prazo as instituições. Tenho dificuldades de ficar inerte diante de um modelo que todos nós achamos péssimo.

Fonte: Jornal O Globo

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