A Constituição de 1988 rompeu o monopólio - estabelecido desde a
primeira Constituição republicana, em 1891 - da nomeação dos ministros
do Tribunal de Contas da União (TCU) pelo presidente da República. De
acordo com a mudança, dos nove ministros, seis são indicados pelo Poder
Legislativo e três pelo presidente da República, sendo dois funcionários
de carreira do TCU, alternadamente um auditor e um procurador, e apenas
um de livre escolha do chefe do Poder Executivo. A nova Constituição
também fortaleceu o poder de fiscalização do Legislativo e, por
extensão, do TCU, que auxilia o Poder Legislativo no controle externo da
administração pública. Além disso, manteve o caráter vitalício do cargo
e reforçou os requisitos para nomeação: mais de 35 e menos de 65 anos
de idade; idoneidade moral e reputação ilibada; notórios conhecimentos
jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração
pública, todos comprovados por mais de dez anos de atividade.
O Senado Federal e a Câmara dos Deputados partilharam as nomeações de
suas seis vagas e indicaram, quase exclusivamente, senadores e
deputados para o cargo de ministro do TCU (ver quadro abaixo). A prática
reiterou o velho vício de nomear para o tribunal de contas pessoas sem a
devida expertise para o exercício do cargo, como Golbery do Couto e
Silva no passado. No período recente, dois presidentes, Collor e Lula,
tiveram oportunidade de nomeações livres e também indicaram pessoas sem a
devida expertise para o TCU. Em duas oportunidades, entretanto, a
reação da sociedade e, sobretudo, dos auditores do tribunal de contas
dificultou as nomeações pelo Senado Federal. A primeira delas se deu com
o senador Luiz Otávio de Oliveira Campos. Acusado de irregularidades, o
senador teve sua indicação criticada pela grande imprensa e, durante
cerca de dois anos, o TCU funcionou com oito ministros, dada a negativa
de o Senado retirar seu nome. Quando isso afinal aconteceu, Raimundo
Carreiro, funcionário da mesa do Senado, tornou-se o único não
parlamentar até hoje nomeado ministro por indicação do Senado, embora
também não apresentasse familiaridade com a missão constitucional do
TCU.
No momento atual, a situação se repetiu com a indicação do senador
Gim Argello, também acusado de irregularidades de forma ainda mais
contundente. Os próprios ministros do tribunal ameaçaram não dar posse
ao senador caso sua aprovação se efetivasse, e as associações dos
auditores e procuradores anunciaram adoção de medida judicial
questionando a ausência do critério de "idoneidade moral e reputação
ilibada" para a indicação do candidato. Diante das críticas,
amplificadas pela imprensa, o candidato retirou seu nome.
Posteriormente, três nomes com perfil técnico receberam aprovação da
Comissão de Assuntos Econômicos, em sessão de 23 de abril. A escolha do
plenário, em 29 de abril, recaiu sobre Bruno Dantas, cujo nome segue
para Câmara dos Deputados para aprovação.
Recrutamento é mais dramático no DF, Estados e municípios
A situação do recrutamento dos membros do tribunal de contas torna-se
ainda mais dramática nos tribunais regionais, estaduais e municipais. A
Constituição determina a adaptação das regras nacionais aos tribunais
estaduais e do Distrito Federal, com sete membros; aos tribunais e
conselhos de contas dos municípios, também com sete membros; e aos
tribunais de contas dos municípios do Rio de Janeiro e São Paulo,
respectivamente, com sete e cinco membros. Em muitos casos, os problemas
de "reputação ilibada" se potencializam, como demonstra o noticiário da
imprensa ("Nos Estados, 15% dos conselheiros de TCEs já sofreram ações
do Ministério Público", "O Globo", 23/9/2013). Seria interessante um
debate sobre o aperfeiçoamento da composição dos tribunais, por exemplo,
aumentando as vagas técnicas, por mérito, em detrimento das indicações
políticas, oriundas do Legislativo e do Executivo, respeitando-se
obviamente as nomeações já efetuadas; ou sobre o estabelecimento de um
critério de mérito mais afinado com a missão constitucional do principal
órgão de controle externo do país e de seus congêneres nos Estados e
municípios.
Fonte: Jornal Valor Econômico
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