A decisão aprovada por unanimidade pelos
ministros do Tribunal da Contas da União (TCU), segundo a qual as
eclusas e o canal de Pereira Barreto, da Usina Hidrelétrica de Três
Irmãos, no Rio Tietê, são de responsabilidade do governo federal – que
terá de dar uma solução para o problema até o início de julho –, não
representa apenas a derrota da administração Dilma Rousseff no jogo de
empurra que vinha travando com o governo do Estado de São Paulo sobre
essa questão. Ela acrescenta mais um problema à conclusão definitiva do
leilão da hidrelétrica, arrematada no dia 28 de março por um consórcio
formado pela estatal Furnas e por um até aquele momento misterioso fundo
de investimentos, responsável pela única proposta então apresentada.
Não faltaram controvérsias a respeito do
leilão, o primeiro a ser realizado de acordo com as regras impostas a
todo o setor elétrico pelo programa anunciado no fim de 2012 pela
presidente Dilma Rousseff, com o objetivo alegado de modernizar o setor,
prepará-lo para o futuro e, sobretudo, reduzir as tarifas para o
consumidor final. De acordo com essas regras, as empresas
concessionárias que desejassem renovar os contratos de concessão prestes
a vencer poderiam fazê-lo em troca da substancial redução da tarifa.
A Companhia Energética de São Paulo (Cesp) não aderiu
ao programa, por entender que a adesão causaria prejuízos financeiros.
Por isso, ela devolveu a Usina de Três Irmãos ao governo federal,
mediante uma indenização por investimentos feitos. A indenização foi
fixada pelo governo federal, sem a concordância da Cesp, que estimava um
valor maior do que o oferecido.
Este é apenas um dos aspectos controvertidos do
programa energético de Dilma, que resultou em perdas tão vultosas também
para as empresas distribuidoras que o governo teve de montar um plano
financeiro de emergência, que está sendo coberto parcialmente com
recursos do Tesouro e pelos consumidores. A principal promessa de Dilma,
a de redução das tarifas, pareceu cumprida no início do programa para
parte dos consumidores, mas os reajustes necessários para cobrir os
rombos gerados eliminarão os eventuais ganhos.
No caso de Três Irmãos, o governo excluiu dos ativos
as eclusas e o canal, para reduzir o valor do negócio e, desse modo,
permitir a redução das tarifas – que tem sido obsessivamente buscada
pela gestão Dilma em todas as concessões de serviços públicos, mesmo com
o risco de inviabilização financeira do empreendimento no médio ou
longo prazos. Na prática, o governo federal tentou empurrar para a
administração estadual a responsabilidade pelas eclusas e pelo canal,
enquanto a hidrelétrica seria operada pelos vencedores do leilão.
Criava-se uma situação tão absurda – por isso
questionada pelo governo do Estado até na Justiça, mas sem êxito – que,
tão logo se anunciou o resultado do leilão, o TCU determinou que a
Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) não assinasse o contrato
com o consórcio vencedor enquanto não se definisse a solução para as
eclusas e para o canal.
Na semana passada, o TCU decidiu que esses bens
pertencem à União, como vinha alegando o governo do Estado de São Paulo,
e deu prazo de 30 dias para o governo federal apresentar uma solução
que permita a assinatura do contrato de concessão.
No consórcio vencedor, Furnas tinha como sócio um
certo Fundo Constantinopla que, descobriu-se alguns dias depois do
leilão, era constituído por empresas sem tradição na área energética.
Uma delas apareceu nos documentos apreendidos na Operação Lava Jato, da
Polícia Federal, para apurar lavagem de dinheiro. Entre os sócios dessas
empresas está um personagem que ficou famoso no governo Collor, o
ex-ministro Pedro Paulo Leoni Ramos, que, por pressão de Furnas, acabou
desistindo do negócio.
A suspensão da assinatura do contrato de concessão até
que não foi ruim para Furnas, pois lhe deu mais tempo para encontrar
novos sócios que respondam por 50,1% do empreendimento. Mas mostra como é
precário o programa energético do governo Dilma.
Fonte: Jornal O Estado de S. Paulo.
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