As primeiras eleições gerais sob a Lei da Ficha Limpa precisam provar
que esta barreira contra a invasão da vida pública por corruptos e
criminosos em geral, condenados na Justiça ou esfera administrativa,
existe para valer.
Ainda mais no país em que há leis que “pegam”
ou não, é difícil aplicar na prática um dispositivo legal contrário aos
interesses de parte dos políticos. A própria história da Ficha Limpa
justifica todo cuidado e atenção da sociedade para que não haja
retrocessos. Que ela não seja revogada na prática pela omissão de
agentes públicos responsáveis por acioná-la.
Oriunda de ampla
mobilização social, deflagrada pelo Movimento de Combate à Corrupção
Eleitoral (MCCE), a proposta da lei foi apresentada ao Congresso como
projeto de origem popular, apoiada por mais de um milhão de assinaturas
de eleitores, como previsto na Constituição, e só foi aprovada, em 2009,
devido à vigilância da própria mobilização política. Vigorou no pleito
municipal de 2012 e agora enfrenta o grande teste das eleições gerais —
para presidente, governadores, Câmara dos Deputados, parte do Senado,
além de Casas legislativas estaduais.
Antes da Ficha Limpa,
valia o preceito constitucional do “transitado em julgado”. Ou seja,
apenas a condenação final, esgotados todos os recursos, era considerada
pela Justiça Eleitoral na avaliação do registro das candidaturas. Ora,
dada a proverbial lentidão dos tribunais brasileiros, corruptos e outros
réus, mesmo condenados em instâncias iniciais com base em sólidas e
irrefutáveis provas, podiam ocupar cargos eletivos e se beneficiar de
imunidades legais.
Quem podia contratar bons advogados,
conhecedores dos meandros da legislação, levava grande vantagem.
Político profissional passou a ser atividade ambicionada por criminosos.
Com
a Ficha Limpa, condenações em segunda instância e/ou por colegiados,
incluindo a esfera administrativa, já são suficientes para impedir o
registro de candidatura.
Preocupa é a capacidade da Justiça
Eleitoral, nos estados e no Tribunal Superior, de processar os pedidos
de impugnação de candidaturas. Levantamento feito pelo Conselho Nacional
de Justiça, revelado pelo GLOBO, contabiliza cerca de 14 mil políticos e
agentes públicos condenados nos tribunais passíveis de serem barrados
pela Ficha Limpa.
Agrava o problema o prazo legal de apenas cinco
dias, contados a partir do pedido de registro do candidato, para que o
MP ou partidos possam fazer a impugnação. Espera-se que haja estrutura
para a Ficha Limpa ser aplicada na prática.
A eficiência da
Justiça Eleitoral, porém, não aconselha otimismo. Pelo menos no Rio de
Janeiro, 15 deputados estaduais, 21% da Alerj, ainda respondem a 23
processos, e 12 são candidatos à reeleição. Entre eles, Paulo Melo
(PMDB), presidente da Casa.
Fonte: Jornal O Globo
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