Para potencializar o efeito da
política monetária no controle da inflação e ajudar a resgatar a
confiança na política econômica, a Confederação Nacional da Indústria
(CNI) defende que uma série de mudanças na política fiscal seja
implementada pelo próximo governo. Uma delas é a adoção de uma meta de
resultado primário estrutural, ou seja, que considere ajustes ao ciclo
econômico, assim como os preços das commodities e de ativos relevantes
para a receita, e desconte as receitas e despesas recorrentes e
operações contábeis.
A CNI quer ainda a criação de um órgão, de preferência, independente
para calcular esse resultado primário estrutural e ajustes na Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF). As propostas serão discutidas amanhã com
os presenciáveis que participam de debate da entidade.
Na avaliação da CNI, a meta de resultado primário estrutural precisa
ser factível, com adoção ou não de uma banda. O governo já faz algumas
deduções da meta como os investimentos e desonerações, porém, a
aplicação do conceito de "resultado estrutural" às metas de superávit
primário seria capaz de simultaneamente dar maior flexibilidade e
transparência à política fiscal.
"Flexibilidade porque, como vimos, os ciclos econômicos e outros
fatores exógenos interferem nos resultados fiscais, não sendo correto
perseguir uma meta rígida em todas as conjunturas nem avaliar a política
fiscal [expansões ou contrações] pela simples variação desses
resultados. Transparência porque o conceito de estrutural permite
dimensionar melhor o esforço efetivo da autoridade fiscal, livre não só
dos ciclos, mas também das chamadas operações não recorrentes,
oferecendo um parâmetro mais adequado para avaliar a sustentabilidade da
política fiscal", explicou CNI. A entidade é presidida pelo empresário
mineiro Robson Andrade. Engenheiro mecânico formado pela Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG), Andrade dirige a Orteng Equipamentos e
Sistemas, que produz equipamentos para os setores como energia,
petróleo, gás, mineração, siderurgia, saneamento e telecomunicações.
Atualmente, uma das principais críticas de economistas de mercado à
politica fiscal brasileira é a qualidade do superávit primário nos
últimos anos, que vem sendo feito com base em receitas extraordinárias
de parcelamentos especiais como o Refis, assim como as "trapaças
fiscais", em detrimento de corte de despesas. O Banco Central (BC), por
exemplo, já faz o cálculo do resultado primário estrutural e o utiliza
como um dos critérios para balizar as decisões sobre a trajetória da
taxa de juros no país (Selic), que atualmente é de 11% ao ano.
"A necessidade de se alterar o regime fiscal brasileiro se deve às
deficiências do atual regime, que não é flexível e compromete a
composição do gasto público, com os ajustes recaindo pesadamente sobre
os investimentos", informou o documento.
Pelos cálculos da entidade, o país precisaria fazer um superávit
primário estrutural de algo em torno de 2% do Produto Interno Bruto
(PIB) para manter a dívida líquida equilibrada. Atualmente, a meta de
primário definida pelo governo é de 1,9% do PIB.
"Uma meta [de primário] invariável ao comportamento da economia
implica grandes dificuldades para cumpri-la nos momentos de crise ou
desaceleração e tendência a desperdício nos momentos de crescimento
vigoroso, em função da maior volatilidade das receitas em comparação ao
PIB. Umas das consequências empíricas desse modelo é que os
investimentos públicos são suspensos ou retardados nos momentos de
crise, quando deveriam ser intensificados, enquanto nos momentos de
bonança econômica cria-se espaço para qualquer tipo de despesa crescer",
ressaltou a entidade em documento.
Por outro lado, a adoção de resultado primário estrutural continuará
não captando os efeitos de políticas parafiscais como, por exemplo, as
operações do Tesouro Nacional com o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES), cujos subsídios implícitos diluem-se na
conta de juros nominais líquidos.
Para a CNI, ajustes na LRF também precisam ser feitos. Os principais
problemas dessa lei, conforme a entidade, são: a ineficácia para limitar
os gastos e a dívida mobiliária na esfera federal; a ênfase sobre
alguns agregados de despesas (pessoal) em detrimento de outros
(custeio), no caso dos estados e municípios; bem como a ausência de
dispositivos adequados para enfrentar as intempéries da economia.
"Embora o binômio "Lei de Responsabilidade Fiscal e metas de
superávit primário", tenha gerado resultados positivos no passado, já
são percebidos sinais de obsolescência diante dos desafios recentes
voltados para a criação de um regime fiscal alinhado com o crescimento
sustentado", explicou a CNI. A entidade frisou ainda que essa "agenda
para o regime fiscal se baseia em mudanças factíveis de implementação no
curto prazo, independendo de reformas mais profundas da estrutura
fiscal e tributária do país, o que não significa que as mesmas não sejam
necessárias".