A dívida total da União,
Estados e municípios com precatórios já atinge R$ 97,3 bilhões - e vem
crescendo em meio à indefinição do Supremo Tribunal Federal (STF) quanto
à forma de pagamento. É o que mostra o mais recente levantamento feito
pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) nos tribunais federais,
estaduais e trabalhistas do país, com dados atualizados até julho.
Precatórios são dívidas das Fazendas públicas com pessoas físicas e
jurídicas que a Justiça mandou pagar em decisão definitiva. Quando isso
ocorre, o tribunal faz uma requisição de pagamento ao ente público,
chamado precatório. Por exemplo: se um servidor entra na Justiça para
cobrar diferenças salariais e ganha, elas serão pagas por precatório. Os
valores são incluídos na proposta orçamentária do ano seguinte.
O problema é que Estados e municípios vêm acumulando dívidas há
anos, deixando os credores a ver navios. Os dados mais recentes do CNJ
mostram que o débito dos Estados é o maior, totalizando R$ 52,7 bilhões
nas cortes federais, estaduais e trabalhistas. Os municípios devem quase
R$ 43,7 bilhões. Já a dívida da União está controlada, totalizando R$
935 milhões. Na Justiça federal, a União conseguiu zerar os pagamentos.
Em uma comparação com o levantamento anterior do CNJ, feito em julho
de 2012, o resultado mostra que a dívida de Estados e municípios cresceu
cerca de R$ 2 bilhões nos últimos dois anos, se levados em conta
processos da Justiça estadual e trabalhista. É difícil definir o número
exato, devido a possível diferença na metodologia do estudo anterior.
"Percebe-se claramente que a conta de precatórios está aumentando. A
situação é preocupante sobretudo em Estados e municípios", diz o
conselheiro do CNJ Fabiano Silveira, que requisitou os dados mais
recentes a todos os tribunais do país, como relator de um procedimento
que acompanha o cumprimento das regras de precatórios pelo Judiciário.
A dívida maior é a do Estado de São Paulo, que soma R$ 21,4 bilhões -
mais de 40% do débito total de todos os Estados e o DF. Silveira aponta
um "quadro de indefinição muito temerário" causado pela ausência de uma
decisão definitiva do STF sobre o assunto. Em março de 2013, a Corte
derrubou parte da Emenda Constitucional 62, que criava um regime
especial de pagamento dos precatórios em até 15 anos. A decisão se deu
no julgamento de ações propostas pela Ordem dos Advogados do Brasil
(OAB) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Na ausência do regime especial, os ministros decidiram fazer uma
modulação dos efeitos da decisão, para dizer que regra se aplica a
partir daí. Mas a discussão foi interrompida em março deste ano por um
pedido de vista do ministro Dias Toffoli. Enquanto isso, o ministro Luiz
Fux deu uma liminar nas duas ações, determinando a aplicação da Emenda
62 até que a questão seja decidida de vez.
"Voltamos a um quadro de indefinição muito temerário", diz Silveira.
"O que teremos no lugar do regime especial de pagamento dos precatórios?
Essa pergunta tem sido feita há 16 meses." De acordo com ele, sem que o
Supremo defina a modulação da decisão, não é possível cogitar sequer
uma nova saída legislativa. "A bola, portanto, está com o STF."
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, também já pediu ao
Supremo uma solução rápida para o problema. Em reclamações apresentadas
recentemente à Corte pela União - para questionar metodologias
divergentes autorizadas por alguns tribunais para contabilizar os
precatórios - o procurador defendeu a aplicação da Emenda 62 enquanto
não se chega a uma conclusão.
"Parece razoável, sob pena de afronta ao princípio da segurança
jurídica, que continue a ser observada a redação vigente antes do
julgamento das ações diretas até que a Suprema Corte defina como será a
modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade,
ressaltando-se a importância de que o STF aprecie a questão o mais
rapidamente possível", disse Janot.
O presidente da comissão de precatórios da OAB nacional, Marco
Antonio Innocenti, afirma que a maioria dos tribunais está aplicando a
Emenda 62, mas conta que recebeu denúncias de atraso em vários locais do
país.
A OAB defende a criação de um fundo, administrado pela União, para
socorrer os entes públicos que não tenham capacidade de quitar seus
débitos em até cinco anos. Os recursos viriam de percentuais de
depósitos judiciais não tributários. Também propõe mecanismos de
gerenciamento de risco das ações judiciais e provisionamento de valores
pelos entes públicos.
O assunto está em debate em um fórum que conta com a participação da
Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, a Advocacia-Geral da
União, a OAB, além de representantes dos entes públicos.