Luiza Damé e Isabel Braga
Cinco dias antes do
encerramento do prazo final, em 9 de junho, o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva sancionou ontem, sem vetos nem mudanças, a lei que proíbe a candidatura
de políticos com condenação judicial por crimes graves. A lei, conhecida como
Ficha Limpa, é resultado de um projeto de iniciativa popular, apresentado na
Câmara em setembro do ano passado, com mais de 1,3 milhão de assinaturas.
Agora, começará no
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e no Supremo Tribunal Federal (STF) o debate
sobre se a exigência de ficha limpa vale para as eleições de 2010 e se a lei
será aplicada para barrar os candidatos que já foram condenados ou apenas para
os que vierem a ser condenados.
Uma emenda de redação,
apresentada pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ) e aprovada no Senado,
provocou polêmica sobre a abrangência da lei e sua validade para as eleições de
outubro. Os senadores substituíram a frase “os que tenham sido condenados” por “os
que forem condenados”.
Há a interpretação de
que a nova lei só valerá para condenações futuras. O presidente do TSE, Ricardo
Lewandowski, entende que a lei abrange apenas os condenados entre a sanção
(segunda-feira) e o registro das candidaturas, em 5 de julho.
A Advocacia Geral da
União (AGU) recomendou ao presidente a sanção da lei, sem vetos. Sobre a emenda
de redação, a AGU disse que deve ser ouvida a Comissão de Constituição e
Justiça do Senado, que a aprovou, considerando que não modifica o espírito da
proposta. Integrante do Movimento Ficha Limpa, o presidente da Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, comemorou: — O recado foi dado
pelos eleitores: basta de corrupção, de usar os mandatos como instrumento de
impunidade.
Basta de tratar a
política como negócio privado. É uma vitória da sociedade, um grito de
independência pela ética na política.
Ophir disse que não há
por que pôr em dúvida a aplicação da nova lei nas eleições deste ano. E lembrou
que a própria lei de inelegibilidades foi aprovada em maio de 1990 e vigorou
nas eleições do mesmo ano: — Justificou-se à época que não haveria modificação
no processo eleitoral, mas no requisito de elegibilidade.
Por que valeu para
aquela época e agora não vale? Ophir disse achar que a alteração do tempo
verbal feita pelo Senado não alterou a essência do projeto: — É uma
interpretação absurda.
O entendimento é o de
que ainda não temos candidatura, elas só serão formalizadas depois. A lei
abrange todos os que estão condenados em processo em curso.
Especialistas em
legislação eleitoral entendem que, como a lei foi sancionada antes de 9 de
junho, data de início das convenções partidárias para escolha dos candidatos,
as regras poderão ser aplicadas neste ano. Mas os prejudicados pela lei poderão
recorrer à Justiça, pois a Constituição estabelece que as normas eleitorais têm
de ser aprovadas pelo menos um ano antes do pleito.
Inelegibilidade
passa para oito anos
Pela legislação atual,
são considerados inelegíveis apenas os candidatos com condenação definitiva, em
última instância da Justiça. A Lei Ficha Limpa veda a concessão do registro
eleitoral aos condenados na Justiça por crimes graves, em instância colegiada
(decisões tomadas por mais de um juiz).
Estão incluídos, por
exemplo, processos de cassação de mandato, crimes contra a vida, tráfico de
drogas e improbidade administrativa.
A lei veda ainda o
registro de candidatura aos políticos condenados por crime eleitoral cuja pena
é a prisão, e também aos políticos que renunciarem aos mandatos para que não
seja aberto processo por quebra de decoro. O prazo de inelegibilidade é
ampliado de três para oito anos.
O deputado Índio da
Costa (DEM-RJ), um dos relatores do projeto na Câmara, comemorou a sanção: —
Foi um grande passo, mas precisamos dar continuidade a esse trabalho, através
da reforma política.
Jovita José Rosa, do
Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, que articulou a coleta de
assinaturas para o projeto de iniciativa popular, vibrou com a sanção. O MCCE
integra mais de 40 entidades da sociedade civil: — Estamos que é só alegria e
já pensamos na reforma política. Se o Congresso não faz, a sociedade vai fazer.
Estamos com uma
mobilização boa, não podemos deixar que se desfaça.
Temos que ousar mais.
A proposta original
vetava a candidatura até dos políticos condenados por crimes graves em primeira
instância, mas enfrentou resistência.
Fonte: O Globo
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