Num ridículo episódio de caipirice cosmopolita, ao passear no
teleférico do Complexo do Alemão, Christine Lagarde, diretora do Fundo
Monetário Internacional, disse que estava se sentido “numa estação de
esqui” dos Alpes. A doutora achou que viajara ao futuro, mas estivera a
bordo das maquinações do passado e das empulhações do presente. Em
breve, o teleférico será operado pela empresa de Tiago Cedraz, filho do
presidente do Tribunal de Contas da União, o veterinário e ex-deputado
Arnaldo Cedraz.
A obra custou R$ 253 milhões e foi inaugurada duas vezes (em 2010 e
2011) sem que o serviço estivesse em plena operação. Funcionando, ele
reduz para 19 minutos uma caminhada que pode durar até duas horas.
Quando madame Lagarde esteve nos Alpes cariocas, o governo do Rio já
começara a atrasar os repasses para a manutenção do serviço, e a
concessionária se desinteressara pela renovação do contrato, dispensando
alguns funcionários. O colapso financeiro do Rio já havia começado.
No mundo da fantasia, dera tudo certo no andar de cima. As empreiteiras
Odebrecht, OAS e Delta orgulhavam-se da obra. A Delta foi apanhada nas
traficâncias do bicheiro Carlinhos Cachoeira e foi declarada inidônea
pela Controladoria-Geral da União. A OAS, apanhada na Lava-Jato, está em
recuperação judicial. A empresa Supervia, filhote da Odebrecht, ficou
com a exploração do serviço.
À época, Lula, Dilma, Sérgio Cabral e Pezão saciaram-se na publicidade.
Sobrou um teléferico para ser operado. Essa, a parte que exige trabalho
e não rende propaganda, tomou outro curso, o dos serviços públicos para
o andar de baixo. Às vezes o teleférico funcionava num horário
proibitivo para quem precisava pegar no batente de manhã cedo.
A SuperVia desistiu da operação e devolveu a maravilha à Viúva. O
repórter Ítalo Nogueira revelou que o governo do Rio concluiu a
licitação para escolher a nova operadora do teleférico do Alemão.
Venceu-a uma empresa do advogado Tiago Cedraz, criada em abril passado.
Sem licitação, a prefeitura do Rio já entregara a Cedraz a operação de
outro teleférico, menor, no Morro da Providência.
Ricardo Pessoa, um dos empreiteiros presos pela Lava-Jato, contou ao
Ministério Público que deu R$ 1 milhão a Tiago para ajudar na liberação
de um contrato de R$ 2 bilhões para obras da usina nuclear de Angra 3.
Pessoa pagava também R$ 50 mil mensais ao escritório do advogado para
cuidar de seus pleitos. Ele confirma ter trabalhado para a UTC, mas nega
ter tocado em propinas.
Tiago Cedraz tem 33 anos e diplomou-se em 2006. Entre 2009 e 2013,
formou um patrimônio imobiliário avaliado em R$ 13 milhões, mais um
jatinho Cessna de dez lugares. Teve um conversível vermelho, mas seu pai
fez com que o devolvesse. Vive em Brasília, e seu escritório acompanha
35 mil processos. Em 182 atuou no Tribunal de Contas. Em julho, a
Polícia Federal visitou-o, cumprindo um mandado de busca e apreensão.
Cedraz informa que criou a empresa Providência Teleféricos “quando
surgiu a oportunidade de participar das concorrências”.
Quando madame Lagarde for esquiar nos Alpes, poderá perguntar se há por
lá algum teleférico que tenha passado por tantas peripécias, com
personagens tão pitorescos.
Fonte: Jornal Folha de S. Paulo
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