O governo estadual anunciou ontem um corte R$ 18,4 bilhões no orçamento deste ano, estimado inicialmente em R$ 79,9 bilhões. Com o contingenciamento de 23%, o estado terá para gastar apenas R$ 61,5 bilhões. Segundo a secretária estadual de Planejamento, Cláudia Uchôa, até mesmo as áreas essenciais serão afetadas. A segurança perderá R$ 2 bilhões, o que representa 32% do que estava previsto (R$ 10,2 bilhões). Na educação, a redução será de 9,3%. Até mesmo a saúde, cuja situação beira o caos, perderá verba (7,6%). Também haverá grande corte nas áreas de assistência social (30,91%) e administração penitenciária (22%).
Apesar da repercussão dos cortes, num estado que já enfrenta sérios problemas, Cláudia Uchôa disse que o ajuste levou em consideração as secretarias prioritárias, que tiveram uma redução média de 17,7%, contra uma queda média nos demais órgãos de 35,9%.
Nos gastos com pessoal, a redução será de 18,10%, o que significa dizer que haverá R$ 7,8 bilhões a menos. Apesar disso, Cláudia Uchôa procurou acalmar os ânimos. Disse que o governo não deve fazer demissões e que mais recursos podem ser liberados, caso a arrecadação aumente.
— O corte não foi linear, mantivemos despesas de manutenção e as atividades que essas secretarias fazem com um ajuste menor. Esperamos que os funcionários tenham tranquilidade para trabalhar — disse a secretária.
O decreto determinando o ajuste nas contas do governo será publicado hoje no Diário Oficial. O maior corte previsto é de 53% em despesas obrigatórias — que incluem pagamento de precatórios, dívidas do estado e sentenças judiciais, além de projetos do governo. Com isso, somente essa área terá uma redução de R$ 6,3 bilhões.
Segundo a secretária de Planejamento, o cálculo do ajuste foi baseado na revisão da estimativa da receita para este ano. A previsão é que haja queda, por causa da crise no setor de petróleo.
No ano passado, o governo estimava arrecadar R$ 75 bilhões, mas só entraram R$ 62 bilhões, incluindo R$ 7 bilhões dos recursos do Fundo Judicial do Tribunal de Justiça. O ano de 2015 fechou com um rombo nas contas de R$ 13 bilhões. Os dados constam do último relatório da execução orçamentária, divulgado na semana passada.
O governo do estado ainda deve R$ 3,3 bilhões de serviços contratados de fornecedores em 2015. São os chamados restos a pagar. A Secretaria de Fazenda afirmou que ainda não há uma data para quitar essa dívida.
Para o economista Gilberto Braga, do Ibmec, embora o corte seja necessário, áreas essenciais deveriam ser poupadas:
— Cortar onde está faltando, como em saúde e educação, é muito complicado de justificar. O estado deveria investir em treinamento para melhorar a gestão, em vez de simplesmente fazer um corte quase que linear nas áreas — disse Braga. — Quem tem gordura consegue emagrecer e sobreviver, mas isso numa área que já esteja no osso pode provocar uma fratura irreversível.
Presidente da Comissão de Finanças e Orçamento da Alerj, o deputado Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB) prevê um ano de "cinto apertado" e criticou o que chamou de "ajuste horizontal":
— O corte tem que ser feito, mas não pode ser igual para todo mundo. É preciso ponderar os contingenciamentos em áreas prioritárias, como saúde e educação.
O anúncio do arrocho nas contas foi feito no mesmo dia em que a Alerj votou uma ajuda da União para amenizar os problemas do estado. Numa votação marcada por ataques até de aliados contra a administração de Pezão, foi aprovado ontem, em sessão extraordinária, um empréstimo de R$ 1 bilhão do Banco do Brasil para pagar a aposentados e pensionistas. O aval à proposta foi unânime, apesar do desgaste na relação com o Poder Executivo. O empréstimo aprovado visa a compensar parte das perdas de R$ 3,5 bilhões do estado com royalties do petróleo no ano passado.
O tom duro das críticas partiu dos principais nomes do PMDB, como o presidente da Alerj, Jorge Picciani, e o líder do governo na Casa, Edson Albertassi. Eles se irritaram com a falta de informações sobre as condições do empréstimo, como taxas de juros, prazo e carência, que não constavam do texto. Deputados da oposição, como Luiz Paulo e Marcelo Freixo (PSOL), chegaram a dizer que se tratava de um cheque em branco para o governo.
Depois das queixas, uma tabela com os valores foi enviada à Casa às pressas. A taxa de juros será de 1.57% ao mês para um prazo de 15 anos e carência de 12 meses. De estilo contido, do tipo que mede as palavras, Albertassi fez questão de registrar sua insatisfação.
— Tenho que reconhecer a omissão de informações nas matérias do governo que têm sido votadas nessa Casa — disse.
Já Picciani subiu o tom contra a administração de Pezão e disse que "o governo não tem feito o dever de casa", e afirmou que a qualidade dos serviços públicos caiu vertiginosamente. Ele reclamou que o governo tem enviado projetos complexos, como de aumento de impostos e de extinção de empresas para a Casa aprovar de um dia para o outro.
- A pior coisa é se a gente perder a harmonia na relação entre os Poderes e ficar sem vontade de ajudar o estado. Não estamos aprovando isso pelo governo. Estamos fazendo isso pelos servidores do Rio. O governo precisa se organizar e estabelecer um diálogo franco. Eles têm enviado os projetos para essa Casa 22h30m. Não é razoável isso - atirou Picciani.
Ele também voltou a criticar o projeto de ajuste fiscal que Pezão enviou à Alerj na terça-feira. A proposta, cunhada como Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) estadual, foi alvo de duros ataques de Picciani. O texto prevê o uso dos fundos da Alerj e do Judiciário para pagamento de pessoal, o que hoje é vedado pela legislação.
- Eu acho irresponsável o discurso do governo de que se aprovado esse projet resolve a crise. Há uma série de inconstitucionalidades —- disse o presidente da Alerj.
Fonte: Jornal O Globo
|