SÃO PAULO e BRASÍLIA - Às vésperas de uma possível troca de comando no
governo federal, os governadores do Rio, Minas Gerais, São Paulo e Santa
Catarina se reuniram na terça-feira na residência de Luiz Fernando
Pezão, na Zona Sul carioca, para discutir uma saída para a bilionária
dívida dos estados com a União. Em meio à instabilidade política, o
encontro terminou sem qualquer proposta concreta. O governador em
exercício do Rio, Francisco Dornelles, expôs sua posição e defendeu uma
moratória temporária do pagamento dos juros à União por pelo menos dois
anos, para que os estados possam reequilibrar seus orçamentos. A tese,
porém, não foi encampada formalmente pelos demais governadores.
Na reunião, houve consenso de que é preciso esperar a instalação de
um eventual governo do vice-presidente Michel Temer para dar início à
discussão, com o Ministério da Fazenda, sobre uma renegociação da dívida
pública. Os governadores estão esperançosos de que, em uma gestão
Temer, seja encontrada uma solução para a dívida dos estados, estimada
em R$ 107 bilhões. O ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles,
cotado para assumir o Ministério da Fazenda, já começou a se encontrar
com governadores para tratar do tema e teria mostrado disposição em
negociar com os estados. Meirelles teria dito que a pauta estava entre
as prioridades de sua eventual gestão.
PARA SECRETÁRIO, PRAZO DE CINCO ANOS
No encontro, Dornelles foi enfático sobre a situação dos estados:
— Todos os estados estão com um fluxo de caixa muito violento, as
receitas caíram, e as despesas indexadas subiram, de modo que você tem
um descontrole financeiro a curto prazo, e as despesas e juros são todas
muito altas. Precisávamos de uma moratória de dois anos de juros para
renegociar essa dívida.
O Estado do Rio deve hoje R$ 67 bilhões à União — o que representa
67% do total da dívida pública dos estados, que soma R$ 107 bilhões.
Neste ano, a estimativa é que o governo fluminense desembolse cerca de
R$ 5,5 bilhões apenas com o pagamento de encargos e juros da dívida. Com
o estado praticamente quebrado e sem conseguir honrar compromissos
básicos, como pagamento de salários dos servidores, é exatamente desse
peso que Dornelles gostaria de se livrar a curto prazo.
Para o secretário de Fazenda do estado, Julio Bueno, a penúria dos
governos estaduais requer cinco anos de carência para o pagamento dos
juros da dívida, e não apenas dois. Segundo ele, a dívida é consequência
da pressão da Previdência fluminense, que tem um déficit de R$ 12
bilhões.
— A situação é de desespero, e isso não acontece só com o Rio. O
déficit previdenciário de Minas é de R$ 10 bilhões; o de São Paulo, R$
18 bilhões; e o do Rio Grande do Sul, de R$ 9 bilhões. Ninguém aguenta
mais isso — afirmou Bueno.
Os governadores de São Paulo, Geraldo Alckmin, e de Santa Catarina,
Rafael Colombo, preferiram o discurso de que é preciso esperar os
desdobramentos políticos em Brasília para discutir qualquer proposta.
Ivo Sartori (Rio Grande do Sul) e Renan Filho (Alagoas) participaram da
reunião por telefone.
— Essa é uma questão federativa que envolve todos os estados. Mas
estamos aguardando os próximos dias, é preciso esperar essa transição
para depois conversar com a nova área financeira — afirmou Alckmin.
— Eu percebo que há continuidade nessa disposição de colaboração mútua — disse Colombo, ao deixar a reunião.
A pressa em resolver o imbróglio da dívida dos estados deve-se a uma
decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) do mês passado. Os ministros
suspenderam por 60 dias o julgamento que vai decidir que tipo de juros
deve corrigir as dívidas dos estados. O prazo dado é para que
governadores e governo federal cheguem a um acordo. A última grande
renegociação entre estados e União aconteceu no governo Fernando
Henrique Cardoso.
A decisão do Supremo foi tomada após 11 estados obterem liminares
para trocar a fórmula de aplicação dos juros de suas dívidas, de
composta para simples. Santa Catarina foi o primeiro a recorrer ao STF.
NO RIO, GASTO COM INATIVOS SALTA 118%
Alguns
estados têm uma situação financeira pior que a de outros, mas, de
maneira geral, o cenário não é animador para nenhum governador. O
secretário de Fazenda de Santa Catarina, Antonio Gavazzoni, explicou
que, apesar de o governo catarinense não ter uma situação dramática (a
dívida soma R$ 9 bilhões), como é o caso de Rio de Janeiro e Rio Grande
do Sul, os próximos anos serão difíceis para todos.
— Na reunião houve consenso de que a negociação com o governo federal
não pode ficar apenas em cima da renegociação da dívida. Ela tem de
passar também por outras questões, entre elas uma reforma da
Previdência. A recuperação econômica do país não acontecerá se o governo
não resolver a crise financeira nos estados — afirmou Gavazzoni.
Ainda não há consenso, porém, sobre qual seria a melhor solução. Uma
das sugestões é o recálculo da dívida de cada estado pela União usando
como indexador o INPC e juros de 4%, regra que passou a vigorar
recentemente em substituição ao IGP-DI mais 6% ou 9% de juros. Com essa
mudança, o valor dos débitos seria drasticamente reduzido. O problema é o
impacto para os cofres federais.
A folha de pagamento do Estado do Rio cresceu 28,9% no ano passado frente a 2014,
chegando a R$ 24,5 bilhões, de acordo com estudo divulgado ontem pelo
Tesouro Nacional. Considerando apenas as despesas com inativos e
aposentados, o valor desembolsado saltou de R$ 4,97 bilhões para R$
10,84 bilhões nesse período — uma alta de 118%.
Com o pagamento do serviço da dívida com a União, o Rio teve uma
redução entre 2014 e 2015. O montante passou de R$ 5,343 bilhões para R$
5,260 bilhões no período, uma queda de 1,55%.
Fonte: O Globo
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