Se este ano o estado vive uma situação de penúria, com um rombo previsto de R$ 20 bilhões, que resulta em atrasos de salários, fechamento de universidade e hospitais, a perspectiva não é de melhora até 2019. Projeções das contas para o ano que vem apontam um novo déficit de R$ 20,8 bilhões. Em 2018, o buraco previsto é de R$ 20,1 bilhões. Já para 2019, espera-se uma melhora, ainda tímida, com um rombo de R$ 18,3 bilhões. Os números foram apresentados na quinta-feira pelo secretário estadual de Fazenda, Julio Bueno, numa audiência sobre a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) na Comissão de Orçamento da Alerj.
De acordo com dados da série histórica do déficit orçamentário, as contas do estado não ficam no azul desde 2010, quando houve um superávit de R$ 2,7 bilhões. Desde então, o governo tem ficado no vermelho. O rombo disparou nos últimos dois anos. Em 2014, foi de R$ 1,7 bilhão. Um ano depois, saltou para R$ 17,5 bilhões, segundo informações da Comissão de Finanças e Tributação da Alerj. De 2010 a 2015, os gastos com a previdência também aumentaram, de R$ 7,8 bilhões para R$ 13,2 bilhões.
— O orçamento de 2015 foi aprovado no segundo semestre de 2014, em meio a um período eleitoral e em regime de euforia com o sucesso do pré-sal. Foram projetadas receitas superestimadas em relação à realidade que se avizinhava: houve uma queda violenta do preço do barril do petróleo, a Petrobras praticamente quebrou por causa da má gestão, as obras do Comperj foram paralisadas e a indústria naval perdeu encomendas e acabou estagnada. Como consequência, as receitas do estado desabaram. Para completar, ainda foi concedido em 2014 um aumento para 49 categorias de servidores, o que se refletiu também na folha dos inativos e no Rioprevidência — disse o presidente da Comissão de Finanças, deputado Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB).
Preocupado com o caixa no vermelho, o presidente da Comissão de Orçamento da Alerj, deputado Pedro Fernandes (PMDB), afirmou que não votará o orçamento de 2017 este ano, caso o governo não envie a proposta com uma lista de medidas saneadoras para zerar o déficit, que incluam cortes de gastos e demissões de comissionados.
GOVERNO DEMOROU A ENVIAR DADOS
Irritado, Fernandes disse que a votação pela comissão do parecer prévio sobre a LDO estava prevista para ontem, mas foi adiada para terça-feira, porque o governo deixou de enviar dados técnicos. O estado só teria liberado as informações na noite de quarta-feira, prejudicando a análise pelos parlamentares e inviabilizando a votação.
— O Executivo deve enviar a proposta. Se vai ser corte ou revisão de cargos de estatutários e comissionados, ou venda de imóveis, isso cabe ao governo do estado. Mas isso tem que acontecer. Não votarei o orçamento enquanto isso não chegar para análise. Não dá para repetir o erro cometido no ano passado. Não vou aceitar um orçamento inflado.
Fernandes chegou a bater boca com o deputado de oposição Paulo Ramos (PSOL), que disse que ele pode acabar destituído da comissão por seu partido, caso insista em não aprovar o orçamento. Em meio à discussão, Ramos chegou a sugerir a venda de prédios do estado como o Palácio Laranjeiras e a residência de praia na Ilha de Brocoió, na Baía de Guanabara. Nos bastidores, a proposta foi interpretada como inócua, já que a negociação daqueles bens arrecadaria alguns milhões, frente a um rombo bilionário.
Diante da pressão de deputados para que o estado corte na carne e dê uma demonstração à sociedade de que também está apertando o cinto, o secretário de Fazenda concordou que é essencial fazer cortes na máquina do governo. Pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o Executivo pode cortar até 20% dos funcionários comissionados.
No entanto, o secretário reiterou que apenas o enxugamento não vai resolver o problema do déficit. Ele frisou que a questão central das contas do estado é o rombo de R$ 12,5 bilhões da previdência.
— A redução de cargos comissionados e da máquina é uma providência essencial. Infelizmente, não resolve o problema. O déficit do Rio tem R$ 12,5 bilhões da previdência. Evidentemente, também há um problema do lado da receita, devido à crise do petróleo — afirmou Bueno, após participar da sessão.
O secretário concordou que é preciso haver um entendimento para que as medidas de austeridade e os cortes de comissionados atinjam também os poderes Judiciário e Legislativo, além do Ministério Público e do Tribunal de Contas do Estado. Esses órgãos, juntos, têm mais de 11 mil cargos de confiança, enquanto o Executivo dispõe de 8.864.
— Entendo que os poderes são independentes. Mas acho que pode haver um grande entendimento sobre isso — disse o secretário, após ser questionado sobre possíveis cortes nos cargos comissionados dos diferentes poderes.
“MAQUIAGEM CONTÁBIL”
Na sessão, durante a discussão sobre o fechamento das contas do estado de 2015, o secretário de Fazenda admitiu que, no ano passado, para efeito de cumprimento dos limites da LRF, o governo acrescentou, na receita corrente líquida, R$ 6,7 bilhões de recursos oriundos de depósitos judiciais do Tribunal de Justiça. Essa receita — que é a arrecadação de impostos estaduais, descontadas todas as transferências obrigatórias para municípios e as áreas de saúde e educação — é utilizada como parâmetro para o cálculo do percentual gasto com pagamento de pessoal. Pela lei, o governo pode desembolsar para essa despesa no máximo 60%. No ano passado, o Executivo utilizou os depósitos para fechar o rombo das aposentadorias do Rioprevidência.
Bueno afirmou que considerar os depósitos judiciais como parte da receita foi “um equívoco”. Contudo, deixou claro que a decisão não foi da Secretaria de Fazenda, mas de todos os poderes.
— Eu me atrevo a dizer que a decisão foi equivocada. Mas foi uma decisão do estado. E a Secretaria do Tesouro Nacional aceitou colocar o depósito judicial na receita. De tal forma, que nós fomos instados a pagar 13% da dívida em cima dessa receita. Foi um conluio do mal de que todos participaram — afirmou o secretário.
Segundo cálculos da Comissão de Finanças, se os depósitos judiciais não fossem incluídos — fazendo a receita total pular de R$ 45 bilhões para R$ 51,7 bilhões —, o TJ e o MP estourariam os limites da LRF com pagamento de pessoal. O Tribunal atingiria 6,36%, enquanto o teto é 6%. Já o MP chegaria a 2,04%, contra um limite de 2%.
Para Luiz Paulo, “foi uma maquiagem contábil”. O deputado chegou a chamar o orçamento de fictício.
Bueno se disse arrependido:
— Eu devia ter esperneado, brigado.
A artimanha nas contas do estado será levada em consideração no parecer das contas do estado que estão sendo analisadas pelo TCE.
Fonte: Jornal O Globo

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