O quadro mais recente dos Estados, que leva em conta a evolução do primeiro quadrimestre deste ano, mostra que pelo menos 18 deles estão com despesa bruta de pessoal acima dos 60% da receita corrente líquida. Na média de um total de 23 Estados levantados, o gasto chegou a 66% da receita. Os cálculos levaram em consideração as despesas de pessoal dos três poderes mais o Ministério Público Estadual (MPE), sem as deduções permitidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). As deduções, embora legais, amenizam o impacto desse gasto. Os dados são de levantamento do assessor econômico do Senado, Pedro Jucá Maciel.
Pelos cálculos de Jucá, dos 23 Estados, sete deles - Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Acre, Paraíba, Piauí, Bahia e Rio Grande do Norte - ultrapassaram os 70%. Levando em conta os relatórios oficiais pela LRF dos Estados, porém, apenas dois deles - Acre e Paraíba - ficaram acima dos 60% estabelecidos legalmente, segundo dados do Tesouro Nacional. Todos os sete ficaram acima pelo menos do limite de alerta de 54%. A LRF estabelece teto de 60% da receita corrente líquida para esse gasto de pessoal global, mas permite a dedução de gastos como ajuda de custo, auxílio alimentação, auxílio creche, vale transporte e plano de saúde, entre outros.
Uma nova definição sobre o que deve ser considerado como despesa de pessoal é uma das contrapartidas acordadas entre União e Estados na renegociação da dívida. Os dados levantados por Jucá foram retirados do relatório resumido de execução orçamentária apresentado pelos Estados. Os cálculos correspondem à despesa de pessoal e à receita líquida de 12 meses encerrados em abril.
Apesar da representatividade dos gastos de pessoal, o levantamento de Jucá mostra também que a elevação média desses gastos de 2015 para este ano foi de 6% nominais. É uma variação abaixo da inflação de 9,3% nos 12 meses encerrado em abril, assinala Jucá. Isso, diz ele, mostra que houve no geral esforço dos Estados nesse período em conter o crescimento desse gasto. José Roberto Afonso, economista do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV), diz que essa expansão abaixo da inflação também significa que o avanço do gasto no período mais recente deve ser resultado muito mais da queda drástica da receita do que de novos aumentos da folha. Ou seja, é possível que Estados já tenham tomado providências para parar com a escalada que ocorreu nos últimos anos, sobretudo em reajustes de pessoal.
Jucá destaca que o impacto da despesa de pessoal é muito maior que os demais desembolsos importantes dos governos regionais. Enquanto a despesa de pessoal equivale a 66% da receita corrente líquida, o serviço da dívida corresponde a
10%, enquanto custeio chega a 18% e investimentos a 8%. "Isso mostra que o serviço da dívida não é o maior problema na estrutura atual dos Estados. A despesa de pessoal tem peso muito maior na estrutura de gastos."
Jucá diz que os valores das despesas foram extraídos dos relatórios resumidos de execução e foram subtraídas as despesas intra-orçamentárias. Nos casos em que a despesa com aposentados e pensionistas não foram computados como gasto de pessoal, o desembolso foi adicionado. Segundo o economista, trata-se de um cálculo que pode ser conservador para alguns entes federados, já que esse número pode não contemplar despesa com trabalhadores terceirizados, muitas vezes contabilizados como despesas de custeio pelos Estados. Os dados, diz Afonso, reforçam a urgência de se debater uma reformulação da LRF para que a apuração das despesas sejam mais rigorosas. O economista do Ibre ressalta que, de qualquer forma, a economia está em depressão e a LRF prevê que, enquanto o PIB crescer abaixo de 1%, os prazos para correção de eventuais excessos nos limites de gasto de pessoal e dívida serão duplicados. Ou seja, em vez de dois quadrimestres, os Estados terão quatro quadrimestres para se ajustar.
Na prática, se essa situação se repetir a cada quadrimestre, como tem ocorrido, esse prazo segue sempre sendo ampliado. "Isso mostra que nossa lei não é tão draconiana quanto alguns governantes reclamam e tem flexibilidade diante de situações atípicas", argumenta Afonso.
André Horta, secretário de tributação do Rio Grande do Norte e coordenador dos Estados no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), diz que as contrapartidas que já foram alvo de consenso na negociação da dívida com a União, e que envolvem a redefinição dos gastos com pessoal, podem não ser suficientes para garantir o reequilíbrio fiscal para todos os Estados.
"São medidas que dão respiro", diz ele, mas para que haja reequilíbrio de contas para todos é também necessário que a economia volte a crescer e que a arrecadação dos Estados se recupere. Ele destaca que a situação dos Estados é muito heterogênea. Com exceção do Estado de Alagoas, argumenta, a dívida com a União tem peso menor para os Estados do Norte e Nordeste, razão pela qual os governos dessa regiões pedem a abertura de novas linhas de crédito dentro da negociação em curso com o governo federal.
Francisco Caldas, secretário de Planejamento do Rio de Janeiro, diz que são dois fatores principais que pressionam as despesas de pessoal do Estado. Uma delas é o alto peso do pagamento aos inativos, do lado da despesa. Pelo lado da receita, ressalta, o Estado tem sofrido com a queda dos royalties do petróleo. Caldas destaca, porém, que o Estado tomou medidas para contenção do gasto, como a criação da previdência complementar, e atualmente está em estudo a elevação da contribuição do servidor. Ele lembra que é necessário também que haja a reforma da Previdência pela União, já que a despesa com inativos do Rio é pressionada pelas regras atuais, como a aposentadoria especial para professores, exemplifica. "É preciso que haja sensibilidade da União e que ela participe disso."
Fonte: Jornal Valor Econômico
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