RIO - Diante do agravamento da crise, o governador em exercício, Francisco Dornelles,
encaminhou à Assembleia Legislativa projeto de lei que reconhece o estado de
calamidade pública no âmbito da administração financeira. A previsão, segundo o
presidente da Alerj, Jorge Picciani (PMDB), é que a proposta, com pedido de
urgência, entre em pauta dia 25. Com a aprovação da lei, o governo pretende ter
liberdade provisória para contrair empréstimos e efetuar pagamentos, sem sofrer
as sanções previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Em 17 de junho, Dornelles adotou uma medida emergencial:
editou o decreto 45.692, declarando estado de calamidade. Mas, como o ato é
frágil, preparou o projeto de lei, datado de 25 de agosto. O envio à Alerj
demorou. Só ocorreu na segunda-feira e, ontem, foi publicado no Diário Oficial
do Legislativo.
— Esse projeto estava dormindo no Palácio Guanabara desde 25 de agosto. A
proposta visa a fazer com que o estado tenha suas obrigações suspensas naquilo
que diz respeito aos artigos 23, 31 e 70 da LRF (que dispõem sobre regras e
prazos para pagamento de pessoal e endividamento). Com a sua aprovação, o
estado, respaldado pela LRF, passa a poder suspender prazos, sem sofrer
penalidades, enquanto perdurar a calamidade financeira. Por isso é que o governo
está pedindo apoio da Alerj — diz o presidente da Comissão de Tributação da
Assembleia, deputado Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB).
Picciani se reuniu na tarde desta terça-feira, 11, com o líder do governo
na Casa, Edson Albertassi, para tratar da aprovação do projeto do Executivo. Por
e-mail, o presidente da Alerj foi lacônico e comedido quanto à possibilidade de
a proposta virar lei:
— O plenário é soberano.
Na mensagem, Dornelles ressalta que “a gestão das
finanças públicas em meio a um estado de calamidade pública exige forçosamente
medidas de exceção. A adoção delas é necessária, inclusive, para buscar a
continuidade dos financiamentos aos projetos de investimento de um governo.” Diz
ainda que, com a decretação do estado de calamidade, o governo poderá requerer
que “sejam mantidas as transferências de recursos e as concessões de crédito ao
Rio de Janeiro, com os fins de o ajudar a superar as adversidades
financeiras.”
Também na mensagem, o governador faz referência ao artigo 65 da LRF, que
trata da situação de calamidade reconhecida pelo Legislativo. Nesse caso, “serão
suspensas a contagem dos prazos e as disposições estabelecidas nos artigos 23,
31 e 70”, e “dispensados o atingimento dos resultados fiscais e a limitação de
empenho”.
A proposta do Executivo, no entanto, já provoca
críticas. Professor de direito administrativo e gestão pública do Ibmec, Jerson
Carneiro afirma que uma lei reconhecendo o estado de calamidade financeira do
estado seria inconstitucional e poderia ser objeto de uma ação:
— Calamidade é algo não previsível. Receita e despesa,
os governos têm como prever. Se houve perdas com royalties, por exemplo, era
preciso procurar outra fonte de receita. Essa lei, se aprovada pelo Legislativo
e sancionada pelo governador, teria vícios de inconstitucionalidade.
CONSEQUÊNCIAS POLÍTICAS
Além disso, Carneiro argumenta que a lei da calamidade
poderia ensejar outras iniciativas contra os administradores. Uma delas, segundo
ele, seria o Ministério Público ingressar com ação de improbidade, por danos ao
erário e por ferir princípios da administração. O presidente da República —
acrescenta ele — poderia também assinar decreto de intervenção da União no
estado, conforme previsto nos artigos 34 e 36 da Constituição, que fixam o
mínimo a ser aplicado nas áreas de saúde (12% das receitas tributárias e de
transferências) e educação (25%). Mais uma hipótese prevista, de acordo com
Carneiro, é o governador sofrer um processo de impeachment, por crime de
responsabilidade, sendo que o pedido poderia ser feito por qualquer cidadão ao
Legislativo.
Com o descumprimento do limite para endividamento
previsto na LRF (200% das receitas correntes líquidas), o estado já anunciou na
segunda-feira medidas para cortar despesas, entre elas a suspensão do pagamento
de fornecedores por 30 dias, com exceção das áreas de saúde, educação e
segurança. Um novo decreto, com a redução dos cargos em comissão, está sendo
elaborado.
Fonte: Jornal O Globo