BRASÍLIA - Em um Congresso onde o medo de virar alvo da Lava-Jato se
espalha, as propostas para mudar regras de investigação, aliviar
punições e aumentar o controle sobre os investigadores acirraram os
ânimos e puseram em campos opostos parlamentares e integrantes do
Judiciário.
Um dia após procuradores da Lava-Jato reclamarem de
projeto que pode inviabilizar a investigação nos casos em que forem
feitos acordos de leniência, entidades de magistrados acusaram deputados
e senadores de tentar barrar as ações contra corrupção. No Senado, o
presidente Renan Calheiros (PMDB-AL) disse que vai convidar o juiz
Sérgio Moro para discutir o projeto que pune o abuso de autoridades, e
ainda anunciou a criação de comissão para identificar os supersalários,
incluindo os do Judiciário. A medida foi considerada uma retaliação por
magistrados.
O presidente da Associação dos Magistrados
Brasileiros (AMB), João Ricardo dos Santos, criticou também a iniciativa
de deputados de incluir no projeto das dez medidas contra a corrupção a
punição por crime de responsabilidade para magistrados e membros do MP.
—
A situação está mais grave que imaginávamos. Jamais se falou em crime
de responsabilidade para juízes. Isso é altamente subjetivo. Juízes
serão julgados pela classe política. É um atentado à democracia, um
golpe à Constituição. Imagine a magistratura inteira à mercê da classe
política — disse Santos.
Na Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ),
presidente da Casa, abortou a votação em regime de urgência do projeto
que altera as regras para acordos de leniência com empresas envolvidas
em corrupção. Embora negue ter recuado por conta das críticas da
força-tarefa da Lava-Jato, Maia afirmou que o dever do Parlamento é
“atender a sociedade como um todo e não apenas uma parte” dela.
—
Não vou falar sobre o que não li (as críticas da Lava-Jato). Eles, de
forma democrática, podem fazer a crítica onde eles quiserem, sobre o que
quiserem. E nós estamos aqui, eleitos pela população, para votar as
matérias — disse Maia.
Iniciativas para minar as apurações
passaram a ser feitas na surdina. Nos dois mais recentes casos, surgiram
textos de projetos que, vindo a público, ficaram sem dono. Primeiro foi
a proposta de anistia de crimes de caixa dois, cuja redação circulou na
Câmara, mas, uma vez divulgado, não pôde ter a autoria identificada.
Não prosperou.
O líder do governo, André Moura (PSC-CE), foi
apontado por colegas como autor de texto, enviado às lideranças dos
partidos, que exclui o Ministério Público de acordos de leniência para
empresas e executivos. Depois de divulgada a proposta, Moura alegou que
não era dele.
Ontem, ao falar de sua tentativa de instalar a
comissão para tratar do projeto do abuso de autoridade, criticado pelo
Ministério Público Federal, Renan Calheiros deixou claro que no
Parlamento, neste momento, está difícil encontrar alguém que queira
assumir um embate com os procuradores:
— Na quarta-feira, vamos
decidir o relator (do projeto). Ainda não decidimos porque alguns
(parlamentares) gastaram sua cota de coragem, e a gente precisa
reestimulá-la — disse Renan
Fonte: Jornal Extra
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