A trágica situação do Rio de Janeiro abriu uma importante discussão
sobre qual deve ser a solução para a crise fiscal dos Estados e sobre
qual deve ser o papel do governo federal nesta solução.
É inegável que parte importante dos problemas do Rio de Janeiro
(e de outros Estados) deve-se a uma gestão fiscal irresponsável e a
distorções estruturais sérias, como aposentadorias precoces de
servidores. Neste contexto, uma política que alivie a situação
financeira do Estado – sem forçá-lo a rever os excessos no aumento de
gastos e na concessão de benefícios tributários – é uma solução ruim,
pois cria um incentivo a que os Estados sejam fiscalmente
irresponsáveis, contando com uma salvação futura da União.
Também é verdade, contudo, que parte da crise financeira dos
Estados se deve à forte retração da economia e das receitas tributárias e
que forçar um ajuste apenas por meio da redução de gastos e do aumento
de receitas no curto prazo pode não ser uma saída racional. Cortes
excessivos de despesas em áreas sensíveis – como segurança, saúde e
educação – podem ampliar a tensão social e política e dificultar a
construção de uma saída ordenada para a crise.
Até o presente momento, a forma como a crise fiscal dos Estados
vem sendo conduzida é a pior possível. Por um lado, o governo federal
vem sinalizando que não tem como dar qualquer suporte, dada a gravidade
da crise fiscal. Estranhamente, no entanto, o governo federal tem
exigido dos Estados um ajuste de curto prazo que não está exigindo de si
mesmo. Ao contrário, para as contas federais a proposta é de um ajuste
duro, mas diluído no tempo, nos termos estabelecidos na Proposta de
Emenda Constitucional (PEC) do Teto dos Gastos.
Por outro lado, várias medidas descoordenadas de alívio fiscal
para os Estados vêm sendo tomadas, tais como a renegociação das dívidas
com a União, a sinalização de que os Estados poderão contrair dívidas
com base em recebíveis futuros (como royalties) ou a discussão judicial
em torno da partilha da receita com a multa sobre a regularização de
ativos no exterior. O problema é que essas medidas não necessariamente
beneficiam os Estados mais necessitados e, principalmente, não vêm
acompanhadas de soluções para os problemas estruturais que comprometem
as finanças estaduais.
A solução racional para os desajustes das finanças estaduais é,
provavelmente, a mesma que a União está adotando para si. Ou seja, seria
preciso estabelecer limites rígidos, mas factíveis, para o crescimento
das despesas estaduais. Esses limites teriam de ser proporcionais à
situação de cada Estado: quanto mais desequilibrado o Estado, mais duro
tem de ser o limite e mais longo o prazo de sua aplicação.
Para alguns Estados, essa política pode exigir um aumento
temporário do limite de endividamento, exatamente como ocorre para a
União (que, se não tivesse possibilidade de se endividar, hoje estaria
na mesma situação do Rio de Janeiro). O essencial é garantir uma
trajetória sustentável para as dívidas estaduais no longo prazo.
Por fim – e principalmente –, é essencial que sejam feitas
mudanças estruturais que criem condições para que os Estados se ajustem
no longo prazo. Tais mudanças incluem, entre outros: 1) uma grande
reforma na Previdência do setor público; 2) a racionalização da gestão
das despesas de pessoal, por meio da regulamentação da possibilidade de
redução de jornada com redução proporcional de vencimentos e a redução
do escopo da estabilidade dos servidores; 3) o fechamento de brechas que
têm permitido driblar os limites às despesas de pessoal da Lei de
Responsabilidade Fiscal; e 4) a eliminação progressiva e coordenada dos
benefícios da guerra fiscal do ICMS.
Fonte: Estado de S. Paulo
|