A ausência de contrapartidas e a queda brutal da receita colocam em
xeque os resultados do pacote de renegociação das dívidas dos Estados,
aprovado pela Câmara no final do ano passado e já sancionado pelo
presidente Michel Temer. Essa é a conclusão de um estudo feito pelo
banco Credit Suisse.
Na avaliação do economista Paulo Coutinho,
responsável pela análise, se os Estados não implementarem o duro pacote
de ajustes, que inclua medidas como o congelamento de salários e de
benefícios e a redução gradual de renúncias fiscais, além de
privatizações, eles correm o risco de entrar em crise em 2019. “Não é
possível afirmar categoricamente, porque não sabemos como cada Estado
vai reagir, mas a probabilidade é alta de a crise voltar em três anos se
não fizerem os ajustes necessários”, diz Coutinho. A projeção leva em
consideração dois fatores.
O primeiro deles é a forma como o
pacote saiu do Congresso. A lei prolonga por 20 anos o prazo de
pagamento das dívidas com o Tesouro e o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Dá carência e desconto nas
parcelas até junho de 2018. No entanto, os descontos nos serviços da
dívida vão caindo ao longo do tempo: 100% ao que era referente ao
segundo semestre de 2016; 94,7% em janeiro deste ano; a partir daí,
redução em 5,3 pontos porcentuais ao mês até junho de 2018.
Por
essa característica, o relatório destaca que a lei apenas posterga o
pagamento do serviço da dívida, sem alterar o seu saldo total ou os
juros contratados, beneficiando principalmente Estados do Sul e do
Sudeste, que detêm a maior parte da dívida com a União. Outro detalhe: o
alívio maior vai ocorrer em 2017. A diminuição gradual do desconto fará
com que o impacto em 2018 seja menos da metade do ocorrido em 2017.
Insuficiente.
A principal contrapartida prevista é insuficiente, na avaliação de
Coutinho: os Estados que aderirem terão de limitar o crescimento da
despesa ao IPCA do ano anterior. Mas por apenas dois anos. “É muito
pouco em termos de contrapartidas e o prazo é curto: os Estados podem
apenas adotar medidas paliativas, postergar contratações e reajustes,
sem adotar o ajuste necessário”, diz.
Coutinho lembra que o
argumento dos deputados para retirar dos projeto as contrapartidas
consideradas mais enérgicas foi a de que cada Estado deveria ter
flexibilidade para decidir o seu ajuste. “O Rio de Janeiro é um exemplo
de no que essa flexibilidade dá”, diz Coutinho.
A equipe do
governador Luiz Fernando Pezão encaminhou para a Assembleia Legislativa
um pacote que previa cortes de R$ 9,3 bilhões. Mas o lobby dos
servidores sobre os deputados foi forte, diz: propostas que somavam R$ 8
bilhões foram limados do pacote e a economia final será de apenas R$
1,3 bilhão.
Nos últimos dois anos, os Estados fizeram cortes onde
foi possível. O investimento caiu de R$ 65 bilhões para R$ 37 bilhões
ao ano. Houve economia de R$ 32 bilhões nas despesas correntes. Mas os
gastos com pessoal seguem em alta.
Para Coutinho, a história já
mostra que é muito difícil para os Estados atacarem sozinhos o cerne
desse problema, porque é preciso enfrentar a pressão e o
descontentamento de setores organizados entre funcionários da ativa,
aposentados e pensionistas.
“Em menos de 30 anos, este é o sexto
pacote de ajuda aos Estados sem contrapartidas prevendo ajustes: isso
mostra que, sem essas contrapartidas, não haverá consolidação fiscal”,
diz ele. Desde a promulgação da Constituição de 1988 foram feitos
programas de ajuda aos Estados em 1989, 93, 97, 2001 e 2014, mais o do
ano passado.
Outro componente que fragiliza os efeitos do pacote é
a queda da receita. No acumulado dos 12 meses entre outubro de 2015 e
outubro de 2016, os Estados, no conjunto, perderam R$ 34 bilhões.
Na
média, a receita caiu 6,4% entre 2014, véspera da crise, e 2016. Alguns
tiveram queda suave, como Minas Gerais: retração de apenas 2,5%. Outros
registraram redução de dois dígito, como o Espírito Santo, que viu a
receita encolher 15,4%. O baque é maior nos que dependem de
transferências da União. É o caso do Acre, que acumula queda de 17,7%.
Fazendo
uma análise entre o fôlego financeiro oferecido pela renegociação das
dívidas e a queda brutal da receita nos Estados, percebe-se que o alívio
financeiro é mais restrito ainda. O desconto dado pela lei cobre a
queda de receita em apenas quatro Estados – Alagoas, Paraná, Mato Grosso e Minas Gerais. Os demais continuam a sofrer com a retração.
Ao
final do relatório, Coutinho sugere dez medidas de ajuste para evitar
uma recaída nos Estados, entre elas: aumento extraordinário da alíquota
de contribuição previdenciária de 20% a 30%, inclusive de inativos;
congelamento de salários e benefícios em 2017; redução da carga horário
da funcionalismo com redução proporcional dos salários; suspensão de
contratação por período predefinido.
Fonte: Estado de S. Paulo
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