BRASÍLIA — O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, trabalha para
apresentar na próxima semana os primeiros pedidos de abertura de
inquérito com base nas delações de executivos da Odebrecht. A lista
Janot, que pode ser fatal para a carreira de muitos políticos, vem sendo
aguardada com forte expectativa desde dezembro passado, quando foram
concluídos os acordos de delação com 78 executivos da maior empreiteira
do país. Pelo menos 30 pedidos contra ministros, senadores e deputados
já estariam prontos para serem apresentados ao Supremo Tribunal Federal
(STF).
Entre os alvos dos pedidos está pelo menos um ministro do
Tribunal de Contas da União (TCU). Até o momento, três ministros do
tribunal já foram citados nas investigações da Operação Lava-Jato:
Aroldo Cedraz, Raimundo Carreiro e Vital do Rêgo. Os nomes de Cedraz e
Carreiro aparecem nas investigações sobre suposto tráfico de influência e
venda de informações privilegiadas do advogado Tiago Cedraz, filho do
ex-presidente do TCU, para o dono da UTC, Ricardo Pessoa, um dos
primeiros empreiteiros a fazer acordo de delação.
GOVERNADORES TAMBÉM NO ALVO
O
nome de Vital do Rêgo também já apareceu num depoimento em que Pessoa
confessou pagamento de suborno a parlamentares para impedir a convocação
de empreiteiros para depor na CPI da Petrobras. Na época, Vital do Rêgo
era senador do PMDB pela Paraíba e presidia a CPI.
Os procuradores também estão finalizando os pedidos de
inquéritos a serem apresentados ao Superior Tribunal de Justiça (STJ)
contra governadores suspeitos de receberem propina para facilitar a
concessão de contratos da Odebrecht. Não está claro ainda quais serão os
alvos dos primeiros pedidos. Mas sabe-se que os delatores citaram os
nomes dos governadores de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB); Minas
Gerais, Fernando Pimentel (PT), e Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão
(PMDB).
Os procuradores estão fazendo a triagem de um extenso
material sobre políticos que receberam algum tipo de vantagem da
empreiteira, mas não têm foro nos tribunais superiores. As informações
serão destinadas a 60 duplas de procuradores ou promotores que
participaram ano passado de um esforço concentrado da Procuradoria-Geral
da República para interrogar os 78 delatores e concluíram os acordos de
delação em tempo recorde, dado o grande volume de dados.
EXECUTIVOS CITARAM MAIS DE 130 POLÍTICOS
O
envio do material a promotores e procuradores nos estados depende de
decisão do ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no STF. Mas, para
deliberar sobre cada caso, Janot terá que destacar as acusações que
pesam contra cada um dos suspeitos e apontar os motivos legais que
justificariam a transferência das investigações para a Justiça de
primeira instância.
O desmembramento da Lava-Jato em investigações locais deverá
resultar num número ainda mais expressivo de futuros pedidos de
inquérito. Os executivos da Odebrecht citaram mais de 130 políticos de
todos os grandes partidos como destinatários de dinheiro do caixa dois
da empresa. Entre os acusados estão políticos de âmbito federal,
estadual e municipal. Restrita hoje à Brasília, Curitiba, São Paulo e
Rio de Janeiro, a Lava-Jato deverá, com as delações da Odebrecht, se
espalhar por quase todo território nacional.
A análise de depoimentos e provas e a fundamentação de cada
um dos pedidos é considerado complexo e exaustivo. Não por acaso,
procuradores, promotores e até o próprio procurador-geral arregaçaram as
mangas e trabalharam durante o feriado do carnaval. Foi um esforço
extra parecido com o que aconteceu há dois anos, quando Janot apresentou
pedidos de inquérito contra políticos acusados, em Curitiba, por Paulo
Roberto Costa e Alberto Youssef, os dois primeiros delatores da
Lava-Jato.
A primeira lista Janot provocou forte reação de alguns dos
alvos das investigações, entre eles o senador Renan Calheiros (PMDB-AL),
agora ex-presidente do Senado, e do ex-deputado Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), ex-presidente da Câmara, que está preso em Curitiba. A
expectativa no Ministério Público Federal é de que a segunda lista Janot
provoque um contra-ataque ainda mais forte. Para alguns, mesmo antes da
conclusão dos trabalhos, os potenciais alvos dos inquéritos já estão se
articulando para mudar leis, ocupar cargos estratégicos e recompor
alianças para esvaziar a Lava-Jato.
Alguns políticos ainda se movem nos bastidores, mas o quadro
deve mudar quando as acusações vierem à público. Janot e equipe já
decidiram, desde o ano passado, que os inquéritos serão acompanhados de
pedidos de afastamento de sigilo. Ou seja, se considerar consistente o
pedido do procurador-geral, Fachin deverá abrir o conteúdo de boa parte
dos inquéritos e dos depoimentos gravados em vídeo.
Só permanecerão em sigilo informações essenciais para
eventuais pedidos de busca, prisão e outras ações de interesse dos
investigadores. Também deverão ficar em segredo as acusações que os
delatores fizeram sobre pagamentos de propina na Argentina, Equador,
Peru e Colômbia, entre outros países. Essas informações ficarão em
segredo até maio para proteger funcionários da Odebrecht que ainda estão
em área de risco no exterior.
Fonte: Jornal O Globo