Depois da aprovação anteontem do socorro financeiro da União aos estados
em grave situação financeira, na Câmara dos Deputados, o foco, agora,
são as contrapartidas. O texto base recebeu 16 destaques, que começaram a
ser votados ontem em Brasília, e todos tentam modificar o projeto,
suprimir ou amenizar as obrigações ou requisitos que devem ser cumpridos
pelos estados para se serem incluídos no Regime de Recuperação Fiscal.
Entre os benefícios em jogo, está a possibilidade de suspender por três
anos (prorrogáveis por mais três) o pagamento das dívidas com o governo
federal, o que, no caso do Rio, representa a postergação de uma despesa
que só este ano seria de R$ 5 bilhões. Também devem se beneficiar com as
medidas os estados de Minas e do Rio Grande do Sul.
Durante a
sessão de ontem, dois destaques ficaram prejudicados, dois foram
retirados de pauta e dois foram rejeitados com resultado favorável ao
governo, que conseguiu derrubá-los com uma ampla margem: o primeiro por
302 a 98 votos e o segundo por 303 a 51 votos. Outros destaques que
estão na lista para serem votados ainda tentam alterar o artigo que
impede novos reajustes, concursos e criação de cargos pelos três anos de
vigência do regime. Há ainda o que permite aos governadores que
aderirem ao programa de socorro não cumprirem alguns artigos da Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF).
ALÍQUOTA DE 14% DIVIDE OPINIÕES
O
governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, terá que lançar mão de toda sua
habilidade política. Além do Congresso — outros 10 destaques ainda
serão votados na semana que vem e o projeto ainda será apreciado pelo
Senado —, ele terá que negociar com o presidente da Assembleia
Legislativa do Rio, Jorge Picciani (PMDB), que tem se recusado a pôr na
pauta, justamente, a votação de contrapartidas importantes. Picciani
disse que só retomaria as votações do pacote de ajuste fiscal depois que
os servidores estaduais recebessem os salários atrasados. O governo,
por sua vez, só terá os recursos para colocar em dia a folha de pessoal
se conseguir os empréstimos, mas para obtê-los precisa fazer o ajuste.
Entre as principais contrapartidas, está o aumento da alíquota de
contribuição previdenciária do funcionalismo público de 11% para 14%,
que poderá garantir novas receitas para o Tesouro estadual. Picciani,
que se recupera de uma cirurgia para a retirada de um tumor na bexiga,
disse que pode rever sua posição sobre a pauta de votação.
Entre
os deputados, tanto da base governista quanto da oposição, a expectativa
é otimista, mas eles preveem dificuldade para obter consenso em alguns
pontos. Para eles, está fora de cogitação, por exemplo, qualquer
tentativa de aprovar, além do aumento da contribuição previdenciária,
uma alíquota extra de 8%, proposta que chegou a tramitar no ano passado
na Casa.
Apesar de todas as discussões e protestos gerados pelas
tentativas anteriores de aumentar as alíquotas previdenciárias, André
Ceciliano (PT), integrante da Mesa Diretora da Casa, que ocupa a
presidência interinamente, acredita que, desta vez, a proposta deve ser
aprovada.
— Acho que a alíquota de 14% passa. Agora há propostas
como a obtenção de empréstimo e o adiamento da dívida com a União, que
não existiam antes. As condicionantes hoje são duras? São. Mas acredito
que, para o funcionalismo, é importante colocar os salários em dia —
disse.
Colega de bancada e líder do PT, o deputado Gilberto Palmares tem opinião diferente:
—
O PT é contrário a qualquer medida que cause prejuízos para os
servidores ou que leve à redução de investimentos. Somos quatro
deputados e três já votaram contra a autorização para vender a Cedae.
Mas eventualmente podem surgir opiniões divergentes — disse Palmares,
referindo-se ao aval que o Legislativo deu para a venda da Cedae.
Rafael
Picciani (PMDB), que lidera a maior bancada da Alerj (14 deputados),
disse que é preciso aguardar a votação do Senado. Ele, no entanto, não
descarta que o partido vote favorável à proposta de aumentar a alíquota
previdenciária mesmo sem que o estado tenha normalizado o pagamento dos
salários. O Estado do Rio ainda não pagou o 13º dos servidores de 2016 e
apenas servidores da área de Segurança (da ativa e aposentados) e
professores (da ativa) já tiveram seus vencimentos de março pagos. O
salário saiu na sexta-feira passada. O pagamento dos demais servidores
relativos ao mês de fevereiro só foi efetuado na última segunda-feira.
—
Quando o estado propôs em 2016 medidas de ajuste fiscal com aumento de
alíquotas de contribuição, o quadro era outro. Não havia clareza sobre
como aquelas medidas poderiam ajudar a reequilibrar as contas. Agora,
com o acordo negociado com a União, o cenário é outro — observou Rafael
Picciani.
Também membro da Mesa Diretora, Samuel Malafaia (DEM)
não acredita que passe qualquer medida que possa impor mais sacrifícios
ao servidor.
— Com notícias de corrupção todos os dias, vão
propor aumentar o imposto do trabalhador assalariado? Eu vou votar
contra. Acredito que não vai passar — criticou.
Para o líder do
PSDB, Luiz Paulo Corrêa da Rocha, os quatro integrantes da bancada
tucana deverão votar contra a aprovação de boa parte das contrapartidas: —
É um pacote de maldades contra os servidores, que não são responsáveis
por essa situação. Não haverá reajuste salarial, o que já não acontece
há dois anos, o estado fica impedido de fazer concurso público e também
não poderá fazer novos planos de cargos e salários.
O líder do
governo na Alerj, Édson Albertassi (PMDB), disse que pedirá urgência
para a votação do projeto ao presidente da Alerj, Jorge Picciani.
—
O importante é que o estado comece a sair da situação dramática que se
encontra, voltando a pagar os servidores em dia e restabelecendo a
normalidade dos serviços prestados à população — afirmou Albertassi.
BANCOS QUEREM GARANTIAS
Até
agora, a principal contrapartida votada pela Alerj foi a autorização
para a venda da Cedae, que recebeu 41 votos favoráveis e 28 contrários. A
venda da companhia estadual é considerada fundamental para garantir um
empréstimo inicial de R$ 3,5 bilhões junto a instituições financeiras. O
dinheiro arrecadado com a privatização será usado para pagar salários
atrasados de servidores do estado. Pezão estima que a operação possa
estar concluída dentro de 60 dias.
Mas, segundo fontes do
governo, as chances de o estado regularizar sua folha salarial, antes de
as contrapartidas serem aprovadas, são praticamente nulas. O cenário,
considerado improvável, só poderia ser revertido se o ministro do
Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux concedesse uma liminar,
autorizando o estado a contrair empréstimos. Porém, mesmo isso, não
solucionaria os problemas porque os bancos se ressentem de segurança
jurídica para concretizar as operações. Há interesse do mercado
financeiro em fazer os empréstimos, desde que sejam avalizados pela
União para evitar o risco de um calote.
Fonte: Jornal O Globo
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