Está se disseminando a ideia de que a meta fiscal será reduzida pelo governo para permitir as desonerações tributárias. Infelizmente, isso não é o que está acontecendo. Neste ano, a meta de superávit primário não será alcançada, porque houve uma tremenda frustração da receita de tributos e contribuições federais, uma forte desoneração e, ao mesmo tempo, o governo ampliou os seus gastos, que terão crescimento nominal muito acima da expansão da economia.
Para 2013, a proposta orçamentária prevê a mesma receita: uma grande desoneração tributária e um forte aumento dos gastos, superior ao crescimento nominal do Produto Interno Bruto (PIB). O Orçamento da União do ano que vem foi elaborado com a diminuição de R$ 25 bilhões na meta de superávit primário prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Só assim foi possível fechar a conta.
Quando o governo faz renúncia fiscal (com as desonerações), a boa administração das contas públicas aconselha procurar outras fontes de receita que compensem as perdas ou reduzir os gastos. O governo optou pela diminuição do superávit primário.
Gastos estão crescendo em ritmo muito acelerado
De janeiro a agosto deste ano, as despesas da União cresceram 12,2%, em comparação com igual período do ano passado, de acordo dados da Secretaria do Tesouro Nacional - o aumento foi de 4,8% acima do crescimento nominal do PIB. Para 2013, a proposta orçamentária projeta aumento de 13,57% das despesas da União - comparando com os gastos projetados para este ano, que constam do último decreto de contingenciamento, de setembro - para uma variação nominal do PIB, projetada, de 10,94%.
Na estimativa do próximo ano, os gastos do Tesouro com a desoneração da folha de pagamentos de 40 setores da economia foram excluídos das despesas totais. Essa exclusão é necessária para que os dados anuais sobre as despesas sejam comparáveis. O governo foi obrigado a incluir no Orçamento de 2013, como despesa, a estimativa de R$ 15 bilhões de perda com a desoneração da folha.
A expansão acelerada das despesas da União neste ano fez o Banco Central rever sua avaliação sobre a trajetória da política fiscal. No início de 2012, o BC contava com a ajuda fiscal para conter a demanda agregada da economia e, assim, conseguir espaço suficiente para continuar a sua política de redução da taxa de juro básica da economia (a Selic), sem provocar inflação.
Em seu Relatório de Inflação de março deste ano, a autoridade monetária chamava a atenção para "importantes decisões tomadas e executadas (desde o início de 2011), as quais reforçam a visão de que está em curso um processo de consolidação fiscal". E concluia: "O desempenho fiscal observado (até então) e esperado, além de possibilitar a redução do endividamento e do déficit nominal em relação ao PIB, melhora a percepção de risco do país e contribui para assegurar a estabilidade de preços".
No Relatório de Inflação de junho, o tom do Banco Central já havia mudado. O BC advertiu que "medidas de desoneração visando apoiar a atividade econômica podem manter o ritmo de crescimento das receitas em patamar mais modesto, o que eventualmente demandaria contenção adicional de gastos".
A contenção dos gastos sugerida pela autoridade monetária não foi feita. Ao contrário, houve uma elevação das despesas em relação ao estipulado no primeiro decreto de contingenciamento de fevereiro. Com isso, o governo Dilma preferiu sacrificar a meta fiscal a reduzir os gastos, embora essa decisão nunca tenha sido explicitada.
Agora, no Relatório de Inflação de setembro, o BC parece ter entendido o verdadeiro perfil da política fiscal executada pelo governo Dilma. "No que se refere à política fiscal, iniciativas recentes apontam o balanço do setor público se deslocando de uma posição de neutralidade para ligeiramente expansionista", diz o relatório.
Ao mesmo tempo, o Banco Central publicou um anexo ao seu Relatório de Inflação de setembro, com projeções para a trajetória da dívida pública líquida e da dívida bruta com base em parâmetros de mercado. A conclusão do estudo do BC foi que, mesmo com um superávit primário de 2,8% do PIB de 2012 a 2014 e de 2,7% do PIB entre 2015 a 2016, tanto a dívida líquida como a dívida bruta apresentarão forte queda até 2016, em comparação com o PIB. A projeção foi feita com base em um crescimento médio anual da economia de 4% e com a perspectiva de manutenção da Selic média em torno de 8,5% ao ano, durante o período.
Até agora não houve uma explicação convincente para a publicação desse anexo, pois projeções com base em parâmetros do mercado são feitas rotineiramente por analistas, acadêmicos e economistas de todas as tendências, mas não se tinha notícia de uma projeção dessas feitas pela autoridade monetária e publicada em documento oficial. Com o estudo, o BC lançou dúvidas sobre a necessidade de o setor público manter a meta de superávit de 3,1% do PIB daqui para frente.
Uma rápida olhada no resultado fiscal do setor público mostra que o superávit primário de janeiro a agosto está em 2,56% do PIB e em 2,46% do PIB no acumulado em 12 meses até agosto. Isso significa que o esforço fiscal de setembro a dezembro terá que ser intensificado para que a meta de 3,1% do PIB seja obtida, o que parece impossível, mesmo com a exigência do governo para que os bancos públicos repassem cada vez mais dividendos.
Com relação ao próximo ano, a dificuldade para a obtenção da meta fiscal está relacionada não apenas ao forte crescimento das despesas, mas também à exagerada projeção para a receita da União, que consta da proposta orçamentária. Mesmo com as desonerações tributárias, o governo acredita que a arrecadação administrada pela Receita Federal baterá recorde histórico.
A perda de receita em 2013 não decorrerá apenas da desoneração da folha de salários. É importante não esquecer que o Tesouro não arrecadará um centavo sequer com a Cide-combustível, pois as suas alíquotas foram reduzidas a zero para evitar que o aumento de preços dos combustíveis fosse repassado aos consumidores. A arrecadação desse tributo em 2011 foi de R$ 8,9 bilhões.
Fonte: Jornal O Valor Econômico
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