Na próxima segunda-feira, dia 26, as atenções do país estarão novamente
voltadas para o Rio de Janeiro. Dessa vez, o motivo será a grande
mobilização popular que promete levar às ruas centenas de milhares de
cariocas e fluminenses em protesto contra aquela que é vista localmente
por muitos como a maior ação antirrepublicana de nossa história recente.
A questão dos royalties do petróleo é muito sensível aos cidadãos do
Rio, e, para entender o sentimento de indignação e injustiça que hoje os
toma, é necessário conhecer um pouco do histórico e do contexto global
em que ela se insere.
Durante vários anos, mesmo com a crescente produção nacional de petróleo
na plataforma continental brasileira, notadamente na bacia de Campos,
os royalties eram apenas recolhidos sobre a produção terrestre. Isso
deixava o Estado e seus municípios sem recursos para suportar o grande
aumento dos custos dos serviços públicos e para a realização das obras
de infraestrutura necessárias decorrentes dos fluxos migratórios para os
municípios do norte e nordeste fluminense.
E foi apenas no fim de 1985, após uma longa luta política iniciada e
liderada pelo Estado, que a compensação pela extração do petróleo
começou a ser arrecadada e paga.
Anos mais tarde, outra questão crucial para o futuro do Rio de Janeiro
esteve em pauta. Discutia-se a Constituição de 1988, a qual, no artigo
155, parágrafo 2º, excluiu a incidência de ICMS sobre as operações que
destinassem petróleo a outros Estados. Com isso, os Estados produtores
de petróleo, geradores de quase todo o valor agregado no processo
produtivo de derivados, nada passaram a receber, ficando o recolhimento
integral do tributo para o Estado consumidor de derivados.
Naqueles tempos, apesar de a produção de petróleo no que hoje chamamos
de águas profundas ser ainda apenas uma promessa, vivia-se a expectativa
de que as recentes descobertas dos três primeiros campos gigantes
brasileiros na bacia de Campos permitiriam um significativo incremento
da produção no Estado. Apesar das reações ocorridas na época, sob a
argumentação de que o recolhimento dos royalties já seria uma
compensação para o Rio, o Estado acabou ficando sem o direito de
recolher ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços)
sobre o seu mais importante produto.
A situação do Rio, que desde a perda do status de capital para Brasília
vinha sofrendo um processo de esvaziamento, complicava-se a cada dia por
meio de um contínuo desequilíbrio, causado, em grande parte, por herdar
responsabilidades da velha capital sem as devidas contrapartidas
orçamentárias.
Contudo, veio a quebra do monopólio em 1995, a aprovação da Lei do
Petróleo, em 1997, e, com ela, o estabelecimento de um marco regulatório
para o setor que criou um novo tributo a ser cobrado das companhias
produtoras, chamado de Participação Especial, o qual passou a ter 40% de
sua arrecadação repassada aos Estados produtores. O aumento da
arrecadação tributária daí advinda, majorada pelo aumento do preço do
petróleo no mercado internacional na última década, foi fator
fundamental para que finalmente o Rio de Janeiro pudesse equilibrar as
suas contas.
Mas veio a recente aprovação, primeiro no Senado e depois na Câmara, de
um novo projeto de lei que muda a distribuição dos recursos. Os Estados
produtores terão já no próximo ano uma redução de 26,5% para 20% no
percentual de royalties que receberão. O caso dos municípios produtores é
mais trágico. Os recursos cairão de 26,5% para 15% no próximo ano e
para 4% em 2020. E o desequilíbrio fiscal passou a ser iminente.
As saídas para impedir que a lei entre em vigor seriam o veto
presidencial, que poderá ocorrer até o fim deste mês, ou a concessão de
uma liminar pelo STF (Supremo Tribunal Federal) no pedido de suspensão
de tramitação do projeto encaminhado por 49 parlamentares fluminenses e
capixabas, baseado no fato de que a lei viola contratos já celebrados e
ignora direitos adquiridos.
As ruas do Rio clamarão por respeito ao pacto republicano e justiça. Esperemos que os ecos reverberem em Brasília.
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