O
governo federal pode fazer "ajustes" no superávit primário neste ano. O
secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, indicou que mudanças
podem ser feitas na participação dos Estados e municípios, mas não deu
detalhes se haverá redução da contribuição ou retirada da conta.
Em
2012, a meta de superávit primário dos governos regionais era de R$
42,8 bilhões. Mas, segundo estimativas de Augustin, deve fechar entre
R$ 20 bilhões e R$ 25 bilhões. "O que vamos fazer este ano com relação
a aperfeiçoamento ainda não sei. Agora, uma pessoa inteligente vai
perceber onde tem dado problema. Onde aparecem valores muito
diferentes dos que estavam previsto, valores não controlados pelo
governo", disse o secretário do Tesouro.
Augustin
rebateu as críticas sobre o uso de manobras fiscais, como saque do
Fundo Soberano do Brasil (FSB) e antecipação de dividendos, para
cumprimento da meta no ano passado. Segundo ele, não houve nenhuma
alteração no superávit do governo central de 2012 além do abatimento
do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que já havia sido
anunciado.
Uma pessoa inteligente vai perceber onde tem dado problema, onde aparecem valores muito diferentes dos previstos"
Para
o secretário, alguns dos críticos, entre eles governadores, esquecem
de dizer que o superávit dos Estados e municípios ficou abaixo do
definido pelo Executivo. Disse, ainda, que para qualquer superávit
primário que seja feito, a relação dívida sobre Produto Interno Bruto
(PIB) vai apontar para baixo. A seguir, os principais trechos da
entrevista:
Valor: Está em discussão no governo a redução do superávit primário? Qual seria a ideia?
Arno
Augustin: Nós já temos há muito tempo uma política de superávit
primário, que é flexível. Ela é flexível, porque o Brasil, depois de
muitos anos, conquistou o direito de diminuir a relação dívida/PIB a
cada ano, mesmo que não tenha superávit de 3,1% do PIB. O que comanda é
a economia. Então, a opção de manter uma determinada meta, mas com
ajuste, já foi tomada há muito tempo e com base na economia. É isso
que fizemos em 2012.
Valor:
Anunciar uma meta crível de superávit primário já no início do ano
não reduziria as críticas, como as recebidas pelo uso de manobras
fiscais em 2012?
Augustin:
Os nossos críticos se esquecem de dizer que o superávit de Estados e
municípios deve ser algo entre algo entre R$ 20 bilhões e R$ 25
bilhões. Talvez chegue a esse valor. Então não há nenhuma alteração no
superávit do governo central, que não seja aquela já anunciada, que
era a hipótese de reduzir em R$ 25 bilhões, porque foi um ano em que a
União adotou várias medidas de estimulo.
Valor:
Mas a crítica ao governo diz respeito à forma com que o superávit
primário foi cumprido em 2012. Por exemplo, o uso de antecipação de
dividendos.
Augustin:
Você tem aplicação financeira? Acha certo que alguém diga que você
não deve usar os recursos das suas aplicações? Esse tipo de crítica é
antieconômica. Ela é tosca, de quem quer meramente criar um clima de
completa turbulência, quando o governo fez o óbvio. Tinha feito
previsão, em decreto, de R$ 29 bilhões de dividendos. Então qual é
crítica?
Valor: Que o senhor capitaliza o BNDES, para depois ter um aumento no valor de dividendos.
Augustin:
Capitalizar o BNDES por ações e outros títulos, para efeito de
requisitos prudenciais, é uma coisa que nós cumprimos. Outra coisa,
completamente diferente, é receita de dividendos auferidos pelo lucro
do banco. O dividendo é lucro. Essa mistura, que é proposital e
completamente diferente, a gente não concorda.
Valor: Não seria mais interessante ser mais explícito na comunicação das medidas do fim do ano?
Augustin:
Seria ótimo, se eu não soubesse a situação real dos municípios apenas
em dezembro. Mas só sei nos últimos dias do ano. Nós criamos o
Pro-Investe para apoiar Estados e municípios na continuidade de seus
financiamentos. No fim do ano, foi muito forte a adesão, porque
precisavam com urgência desses recursos. Era evidente que estavam com
dificuldades em fazer o resultado primário.
Valor:
Então o governo soube que Estados e municípios não cumpriram o
superávit antes do fim do ano. Não poderia ter assumido que não
atingiria a meta?
Augustin:
Nós anunciamos em novembro que o primário do governo central seria R$
25 bilhões menor. O que nós não poderíamos saber é qual era o volume
do resultado de Estados e municípios. O importante é que temos uma
política de manter o investimento. O Brasil vai reduzir bastante
dívida/PIB neste ano, como fez no ano passado, porque essa é a
tendência. Temos uma situação fiscal invejável, que permite inclusive
que a gente estude alternativas. Um ano faço primário maior, e em
outro menor. Isso é a economia que determina.
Valor: Qual será o superávit primário em 2013?
Augustin:
A economia será um elemento fundamental para que o governo faça sua
análise. Um fato muito importante será a redução de 20% da energia
elétrica. Energia mais barata significa custo mais barato. Isso é
muito importante, porque influencia a inflação. Vai aumentar a demanda
e a aposta do empresário no sentido do crescimento econômico. Por
todos esses efeitos, acreditamos que a economia, em 2013, será boa.
Valor: Mas qual será o superávit primário? Haverá redução?
Augustin:
Vamos decidir. Mas, hoje, se o primário é um pouco acima, ou um pouco
abaixo, isso não tem tanta importância. Qualquer primário que eu
faça, a relação dívida/PIB vai cair.
Valor:
Mas então por que não admitir um superávit primário menor? No ano
passado, a economia estava desacelerando e o governo não admitiu uma
redução da meta.
Augustin: Porque o que comanda é economia, não é a relação dívida/PIB. Não estamos olhando um número frio.
Valor: A pergunta é feita em função das críticas, apontando perda de credibilidade do governo...
Augustin:
O Brasil tem a menor taxa da sua história em títulos de 10 anos, 40
anos e juros internos. Isso é credibilidade, o resto, me desculpe, é
ideologia.
Valor: O superávit primário pode sofrer aperfeiçoamentos?
Augustin:
Isso não decido sozinho, o governo vai avaliar. Agora, uma pessoa
inteligente vai perceber onde é que tem dado problemas, valores muito
diferentes dos previstos, valores não controláveis pelo governo.
Valor: São os Estados e municípios. Mas o que poderia ser feito?
Augustin: Não sei.
Valor: Quais as implicações de começar o ano sem Orçamento aprovado? Já se sabe o contingenciamento?
Augustin: Não fizemos uma análise do ano. Só saberemos disso em março.
Valor: Foi por isso que o governo editou MP, que permite a liberação de R$ 42,5 bilhões neste ano?
Augustin: Exatamente. Fizemos a MP, com medo que isso [a não aprovação do Orçamento] gerasse um atraso nos empenhos.
Valor: Isso não é passar por cima do Congresso?
Augustin:
Não, porque não há diferença de mérito com o Congresso. Não é um
problema político. Nenhum partido era contra, até onde eu saiba. Foi
uma medida de precaução.
Valor: Já chegaram ao valor que o Tesouro terá de desembolsar para poder entregar a redução de 20% na conta de energia?
Augustin:
Não temos a conta final de quanto vai ser mês a mês, mas é
sustentável. Sem falar nos R$ 300 milhões por ano que vou gastar a
menos com essa luz. Isso considerando só governo federal, a
administração direta.
Valor: Esse cenário já contempla o uso das térmicas?
Augustin:
O problema das térmicas é sazonal. Estamos preparados para, dentro
dos recursos que temos, dar uma solução que não retire os 20%.
Valor: Todos os setores da economia serão desonerados em 2013?
Augustin:
Temos um plano de desoneração ambicioso, antigo, e que vai longe.
Agora, se vai ser tudo neste ano, isso eu não sei.
Valor: A mudança solicitada pelo governo do artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal vai permitir mais desonerações?
Augustin:
Sim. Na interpretação do TCU, o artigo 14 proíbe redução de carga
tributária no Brasil. Diz que toda e qualquer carga tributária que for
reduzida tem de ser aumentada, a não ser que isso seja feito no
Orçamento. Até entendo o objetivo, e ele é correto, mas é um artigo
que não encontrou a sua melhor redação. Achamos, sim, que ele deva ser
alterado, para que possamos reduzir carga tributária.
Valor: O Tesouro tem dito deste o fim do ano passado que planeja uma emissão externa de títulos. Quando ela vai ocorrer?
Augustin:
Pretendo fazer a captação logo, até para mostrar que o Brasil
continua com fundamentos cada vez mais sólidos. Só não fizemos no fim
do ano, nem agora em janeiro, porque a treasuries [título da dívida
americana] está em patamar muito alto. Ela será em dólar, mas não
definimos o prazo, provavelmente, será em títulos de dez anos.
Valor: A política de adiar reajustes é apenas um alívio temporário na inflação?
Augustin:
Acho que as principais medidas em termos de inflação estão colocadas.
O câmbio, em um primeiro momento, impacta a inflação para cima. Isso
já passou. O impacto da Selic também já passou. Agora só vem notícia
boa. Energia caindo. Tanto o prefeito do Rio quanto o prefeito de São
Paulo já anunciaram que [o reajuste de tarifas de ônibus] foi adiado
para junho. A gente espera que os outros sigam o exemplo.
Valor: Existem mais medidas de estímulo à economia para sair?
Augustin:
Não há nada de novo. Vamos começar o ano com o câmbio e juro
adequados, com a energia muito mais barata e com a economia em
ascensão
Fonte: Jornal Valor econômico
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