O Legislativo, como o seu próprio nome impõe, tem a missão de criar
leis. Visitantes de outros planetas podem imaginar algo diferente: que
Senado, Câmara dos Deputados e assembleias estaduais e municipais
existem, principalmente, para fazer discursos e conseguir boas posições
na máquina administrativa para parentes e compadres.
O Supremo Tribunal Federal, que não é de outra galáxia, parece carregado
de boas razões ao cobrar dos senadores um pouco mais de atenção nas
tarefas legislativas. Os ministros deram aos senadores um prazo mais do
que suficiente - foram quase três anos - para cuidar de um assunto
obviamente importante: determinar novas regras de distribuição dos
recursos do Fundo de Participação dos Estados. É um dinheiro que faz
parte obviamente importante dos orçamentos estaduais. O prazo ia até 31
de dezembro do ano passado e a lei não saiu do Senado. O STF, aparentemente com boas razões, botou a boca no trombone.
Segunda-feira passada, o presidente interino do tribunal, Ricardo
Lewandowski, estipulou um prazo de cinco dias para que o Legislativo
explicasse a falta de atenção no serviço. A primeira reação do
presidente do Senado, José Sarney, foi subir nas tamancas, dizendo que o
tribunal não deveria se meter em assuntos internos do Legislativo. Depois, o senador abrandou o discurso: "Não digo que o Supremo tenha se
precipitado, digo apenas que procuramos cumprir a decisão do tribunal,
mas não tivemos condições de chegar a uma conclusão. No fim do ano,
quase chegamos a um acordo, mas não conseguimos votar." É uma curiosa
explicação: três anos parecem, pelo menos para o pessoal da plateia, ser
tempo mais do que suficiente para o Legislativo chegar a uma decisão
sobre uma questão técnica de distribuição de recursos. Sarney ficou
devendo um relato sobre os motivos que impediram a votação. Numa
resposta enviada ao STF, os senadores alegam que o tribunal deu muito
pouco tempo para a aprovação da nova lei. Por enquanto a briga feia entre ministros e senadores não prejudicou as
administrações estaduais: o Executivo continua a repassar as verbas aos
estados, baseado em um parecer do Tribunal de Contas da União. Mas é uma
solução provisória, que não dispensa um acordo entre o Congresso e o
Supremo. Parece ter razão a ministra Ideli Salvatti, quando diz que "a disputa
político-partidária não pode impedir que as coisas sejam realizadas".
Fonte: Jornal O Globo
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