RIO – Depois de fazer uma devassa ao longo dos últimos dois anos, o
Ministério da Saúde rastreou um rombo de R$ 47,8 milhões provocado por
contratos irregulares ou mal gerenciados, firmados entre 2005 e 2011, em
seis hospitais federais do Rio de Janeiro. Em relatório cujo conteúdo
foi obtido pelo GLOBO com exclusividade, o Departamento Nacional de
Auditoria do Sistema Único de Saúde (Denasus) relaciona 36 servidores
que responderão a processos disciplinares — há indícios de desvios
envolvendo funcionários públicos. O documento cita ainda 35 empresas que
terão a conduta investigada e poderão até mesmo perder o direito de
participar de novas licitações.
O Denasus, em colaboração com a Controladoria Geral da União (CGU),
encontrou uma avalanche de obras e serviços com preços superfaturados
nos hospitais de Bonsucesso, do Andaraí, de Ipanema, Cardoso Fontes
(Jacarepaguá), da Lagoa e dos Servidores do Estado (Saúde). Ao suspender
obras, repactuar contratos e renegociar preços de insumos e
medicamentos, a União obteve, a partir de 2011, uma economia de R$ 140
milhões. Apenas com as novas licitações para a aquisição de insumos e
medicamentos, a Saúde contabiliza um ganho de R$ 104,2 milhões. A
renegociação de contratos de serviços continuados, como limpeza e
alimentação, poupou R$ 22 milhões aos cofres federais, informou o
ministério.
O rombo apurado nos contratos analisados pagaria a construção e a
montagem de cerca de dez Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) 24 horas,
iguais à instalada em São Gonçalo, em outubro de 2011, com capacidade
para atender até 500 pacientes diariamente, que custou R$ 4,6 milhões. A
investida para recuperar o dinheiro desviado começa agora, com a
abertura de tomadas de contas especiais que chegarão ao Tribunal de
Contas da União (TCU). O desfecho dos processos, porém, com a efetiva
devolução de dinheiro, pode levar mais de uma década.
O resultado das auditorias foi encaminhado à Polícia Federal e ao
Ministério Público Federal, que já têm ações criminais contra os
envolvidos e investigam a atuação das mesmas empresas em centros de
atendimento de outros estados.
— Os hospitais federais do Rio estavam totalmente desintegrados do
sistema hospitalar estadual. Havia uma total desarticulação. Fomos,
inclusive, obrigados a comprometer alguns serviços importantes, como a
urgência e a emergência no Hospital de Bonsucesso, por causa da
suspensão de contratos. A partir de agora, entramos na terceira fase da
reestruturação dos federais do Rio, com as ações de ressarcimento e o
novo modelo de gestão — afirmou o ministro da Saúde, Alexandre Padilha.
Empresa vai gerir seis hospitais
Ele anunciou que, até o fim do ano, o Ministério da Saúde passará a
gestão das seis unidades federais do Rio para a Empresa Brasileira de
Serviços Hospitalares. A empresa já administra os hospitais
universitários em todo o país e terá uma subsidiária no estado.
— Da mesma forma que a regulação de leitos, as compras serão
unificadas. Isso permite ganhos importantes de escala e de gerenciamento
— completa.
Em 2012, os seis hospitais federais do Rio fizeram, em média, 88.920
atendimentos ambulatoriais e 3.086 cirurgias por mês. A maior unidade, o
Hospital dos Servidores do Estado, com 958 médicos e quase 29 mil
atendimentos mensais, também concentrou o maior prejuízo aos cofres
públicos. Lá, os auditores do ministério exigem o ressarcimento de R$
21,9 milhões, quase metade da sangria apurada em toda a rede.
Na unidade do Andaraí, onde a Polícia Federal fez uma operação na
manhã de ontem, os auditores contabilizaram perdas de R$ 1,7 milhão. Em
nota, a PF informou que abrirá inquérito para “verificar a procedência
de denúncia formal dos médicos” da unidade, sobre irregularidades como
desvio de medicamentos, materiais com prazo de vencimento próximo,
estocagem em locais inapropriados e demora na aquisição de insumos.
Ao centralizar as compras dos hospitais federais, o ministério tenta
fechar a principal porta para a corrupção e o desperdício: a aquisição
de produtos e serviços com preço superfaturado. Os contratos de aluguel
de equipamentos, por exemplo, tiveram que ser revistos, após a
constatação de valores muito altos. Só com a renegociação dos contratos
para locação de máquinas de hemodiálise, a Saúde obteve uma redução de
preço da ordem de 40%. Em videocirurgias, a economia chega a 15%.
— Essas constatações nos levaram a encaminhar todo o resultado da
investigação à Polícia Federal. Precisamos descobrir se o mesmo problema
ocorre em outros serviços, em outras unidades — disse Padilha.
Além dos serviços superfaturados, diversas obras nos hospitais foram
classificadas como irregulares. Ao todo, 42 contratos foram suspensos,
dos quais seis tiveram que ser cancelados. A renegociação dos preços de
apenas quatro obras teve impacto de R$ 8,3 milhões. Só em um caso, no
Hospital de Ipanema, o novo contrato provocará uma economia de R$ 4
milhões.
Fonte: Jornal O Globo
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