A presidente Dilma Rousseff só recebeu, até agora, dois governadores
para conversar sobre a proposta de reforma do Imposto sobre Circulação
de Mercadorias e Serviços (ICMS), que está sendo discutida no Senado. Os
dois, por razões diferentes, falaram contra a reforma e disseram que,
da maneira como as coisas estão sendo encaminhadas, é melhor deixar o
ICMS como está. O primeiro deles foi o governador de São Paulo, Geraldo
Alckmin, do PSDB. O outro foi o governador do Ceará, Cid Gomes, do PSB.
O
argumento básico apresentado por Alckmin é que o governo federal vai
gastar quase meio trilhão de reais para compensar os Estados pelas
perdas com uma reforma que tornará o ICMS mais complexo, mais
burocratizado, mais distorcido e assimétrico, com grande potencial para
desindustrializar o país.
O argumento principal utilizado por
Gomes é que a presidente não precisa passar pelo desgaste desta reforma,
que inevitavelmente prejudicará alguns Estados e beneficiará outros.
Para ele, é preferível esperar o Supremo Tribunal Federal (STF) publicar
a súmula vinculante sobre os benefícios estaduais concedidos com base
no ICMS e, só depois, fazer os acordos entre os Estados de convalidação
dos incentivos fiscais atuais.
Governo não aceita seis pontos que estão sendo impostos
É
importante lembrar que as negociações em torno da reforma do ICMS foram
intensificadas depois que o Supremo anunciou que baixará uma súmula
vinculante, declarando inconstitucional todo incentivo concedido pelos
Estados com base no tributo, sem prévia aprovação do Conselho Nacional
de Política Fazendária (Confaz). Depois dessa súmula, a decisão sobre
ação que questione incentivo concedido por um determinado Estado será
monocrática, ou seja, será um mero despacho de cada ministro do STF. Não
haverá necessidade mais de julgamento de mérito. Assim, cairão todos os
atuais incentivos fiscais estaduais.
Até agora, a presidente
Dilma Rousseff não recebeu apoio de nenhum governador para a reforma,
embora alguns deles tenham se mobilizado para defender interesses
específicos em torno das mudanças no ICMS. Vários chegaram a comparecer
pessoalmente às sessões deliberativas da Comissão de Assuntos Econômicos
(CAE), onde uma proposta de reforma foi aprovada.
A presidente
não está satisfeita com o resultado das negociações realizadas no
Congresso, revelou um importante funcionário do governo. Acredita que da
forma que algumas questões estão sendo encaminhadas, a reforma
realmente não valerá a pena e, por isso, não fará sentido repassar uma
conta bilionária para o Tesouro Nacional.
O governo não aceita
pelo menos seis pontos que estão sendo colocados pelos parlamentares. O
primeiro deles é a criação, por meio de emenda constitucional (PEC), do
fundo de compensação para as perdas com a reforma. A
constitucionalização desse fundo foi uma exigência feita,
principalmente, pelos governadores do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. A
PEC foi apresentada pelo relator da Medida Provisória 599, senador
Walter Pinheiro (PT-BA), na terça-feira passada. "O governo não aceita
essa PEC de jeito nenhum", disse uma fonte. "Não tem negociação."
Em
seu parecer sobre a MP 599, Pinheiro criou mais quatro áreas de livre
comércio (ALC), nos municípios de Santarém e Barcarena, no Pará, e em
Estreito e Grajaú, no Maranhão. O governo teme que parlamentares façam
emendas ao substitutivo de Pinheiro, criando outras ALC. "Somos contra a
proliferação dessas áreas, que criam verdadeiras cidades duty free",
disse uma fonte.
A área econômica também não concorda com a
elevação de 25% para 50% dos recursos do Fundo de Desenvolvimento
Regional (FDR) que serão cobertos com verbas orçamentárias, conforme
propôs o relator da MP 599.
A proposta de reforma do ICMS
aprovada pela CAE estendeu a alíquota interestadual de 7% para as
operações comerciais e de serviço dos Estados do Norte, Nordeste e
Centro-Oeste. O governo aceitou que essa alíquota fosse aplicada apenas
aos produtos industriais e agropecuários provenientes dessas três
regiões. "Eles [os parlamentares] ultrapassaram o que tinha sido
longamente negociado", disse uma fonte.
Outra preocupação do
governo é com o projeto de lei complementar que muda o indexador das
dívidas dos Estados e municípios e reduz para três quintos o quórum do
Confaz para deliberações sobre incentivos fiscais. Esse projeto faz
parte do chamado "pacote" da reforma do ICMS. O relator do projeto,
deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), propôs uma fórmula que resulta em
forte desconto das dívidas estaduais e redução do fluxo de pagamento ao
Tesouro.
O governo alega que não tem condições de aceitar a
redução do comprometimento da receita líquida real com o pagamento dos
encargos das dívidas por parte dos Estados, por causa do compromisso com
a obtenção da meta de superávit primário.
Nas negociações
empreendidas sobre essa questão, o governo disse que o máximo a que pode
chegar é conceder um desconto para aqueles Estados e municípios que
possuem saldo de suas dívidas superior àquele que seria registrado se os
débitos fossem corrigidos pela Selic desde a data da assinatura do
contrato. Nesses casos estariam apenas alguns Estados que pagam
atualmente IGP-DI mais 7,5% de juros ao ano e a prefeitura de São Paulo,
que paga IGP-DI mais juros de 9% ao ano. O governo alega que não pode
fugir disso, pois o seu custo de captação é dado pela Selic. Algo
diferente disso seria subsídio puro e simples.
Finalmente, o
parecer de Cunha convalida todos os atuais incentivos fiscais pelo prazo
de 20 anos. A proposta do governo é que os termos dessa convalidação
sejam discutidos pelo Confaz. Por isso, propôs a redução do quórum de
deliberação do Conselho apenas para essa questão. Mas o governo não
aceita que todos os investimentos realizados com incentivos continuem a
ter direito a alíquotas interestaduais de ICMS de 7% e 12%.
Por
todas essas questões, a presidente Dilma Rousseff não voltará a tratar
da reforma do ICMS. Acha que "a bola está com os governadores". Deve
partir deles, disse uma fonte, a iniciativa de chegar a um acordo que
possa ser apoiado pelo governo e bancado pelo Tesouro.
Fonte: Jornal Valor Econômico
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