Belo Horizonte teme que incentivo cause ineficiência; Rio, Brasília e São Paulo discutem custeio.
RIO - O pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Carlos Henrique Ribeiro Carvalho é taxativo:
— O transporte urbano coletivo no Brasil sempre recaiu sobre o usuário. Ele paga a conta. No país, em geral, não tem subsídio.
Nas cidades do Rio e de Belo Horizonte, por exemplo, o usuário arca com 100% da passagem, pois não há subsídio do poder público. Em São Paulo, o governo subsidia 21%. No Distrito Federal, que acabou de licitar as linhas de ônibus, há subsídio de 19% por mês apenas para garantir a gratuidade dos estudantes, idosos e deficientes.
— Achamos que o subsídio tem o risco de acabar premiando a ineficiência, porque o empresário de ônibus já sabe, de antemão, que vai receber algo, então isso pode não estimulá-lo a investir no serviço ou melhorá-lo — diz Ramon Victor Cesar, presidente da BHTrans, órgão responsável pelo transporte urbano na cidade.
Segundo o Ipea, esse modelo tem pesado muito no bolso dos brasileiros mais pobres, que chegam a gastar mais de 13% do seu orçamento com transporte público.
— Na Europa tem subsídio nacional, regional e local. A lógica é que o transporte público é essencial e beneficia toda a sociedade, incluindo o setor produtivo. Na França, as empresas pagam uma parte. Já, no Brasil, quem tem menos paga mais, e se esquece que transporte é atividade-meio, já que possibilita que a pessoa tenha emprego e acesso à Saúde e à Educação — diz Carvalho, que defende um pacto para discutir quem deveria contribuir:
— O ideal era criar um mix de fontes de financiamento para dividir o custo entre o usuário, os grandes empreendimentos e as prefeituras, por exemplo. Agora, a gasolina pode ser um primeiro passo. O governo, que já zerou a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) para privilegiar o transporte individual, aumentaria o preço e pegaria parte dos recursos para financiar o transporte urbano.
Em São Paulo, 21% da tarifa são pagos pela prefeitura, por meio de subsídios que este ano são de R$ 1,45 bilhão. Secretário municipal de Transportes de SP, Jilmar Tatto (PT-SP) lembra a ideia chamada de Cide municipal: segundo essa proposta, defendida pela Frente Nacional de Prefeitos, o dinheiro da Cide seria usado para o financiamento do transporte municipal, como uma forma de diminuir o percentual da tarifa que é pago pelos passageiros e, assim, baratear a passagem.
— A proposta sobre a Cide é, em vez de o dinheiro da contribuição ir para investimento em infraestrutura, como é hoje, fazer com que ele seja transformado em verba de custeio do sistema. Pode ser feito por um projeto de lei, ou por medida provisória, por exemplo. Mas é uma decisão política.
Transporte gratuito
Secretário de transportes do DF, José Walter Vazquez Filho reconhece que o "lascado que anda de ônibus paga, e quem anda de BMW não paga nada".
— O transporte virou pauta porque a meninada foi para a rua. No Brasil, ficamos muito tempo sem discutir mobilidade urbana e, além disso, as lideranças ou são regionais ou são os donos das empresas de ônibus — diz Vazquez: — Pode ser que o carro vire o cigarro de amanhã, mas hoje ainda dá status, e a indústria de automóvel tem grande importância no PIB nacional.
No DF, de acordo com a DFTrans, "juntando metrô e ônibus, a remuneração total dos operadores do sistema de transporte público é de cerca de R$ 1,09 bilhão. Desse valor, cerca de R$ 257 milhões são recursos oriundos do poder público. Há ainda impostos não cobrados sobre combustíveis para empresas em dia com os tributos."
— Não cobramos ISS do Diesel, por exemplo. E, na licitação, o importante era apresentar o menor preço de tarifa. Mas acredito que a sociedade tenha que decidir o que prefere: que o Estado pague o transporte do trabalhador ou construa pistas? Temos Saúde e Educação gratuitas. Fazer o mesmo no transporte não é impossível, mas é preciso que haja discussão — diz Vazquez.
No Rio, Carlos Roberto Osório, secretário de Transportes, diz que há "desconexão" entre a demanda por transporte público e a política do governo federal que subsidia a compra de veículos particulares.
— O governo federal tem que ser parte da solução, pois os municípios têm limite de capacidade de investimentos — diz Osório, lembrando que "nesse momento, para a prefeitura do Rio, não é adequado o poder público entrar com subsídio ao transporte de ônibus": — Para nós, o sistema hoje tem que ser autofinanciável para ser sustentável por tarifas adequadas e justas. Com subsídio, a gente sabe onde começa, mas não sabe onde acaba.
Fonte: O GLOBO ON LINE.
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