O Fundo Monetário Internacional (FMI) recomenda ao Brasil um ajuste da política fiscal em curso e a "aderência a uma meta de superávit primário" (economia para pagamento de juros
da dívida), para reconstruir o espaço de manobra da equipe econômica na
implementação das políticas de governo, garantir uma queda continuada
do endividamento e afastar riscos às contas públicas associados a
operações com os bancos federais e a programas de concessão na área de
infraestrutura. Boa parte da diretoria do organismo multilateral
considera ainda importante que o Brasil
esclareça melhor os conceitos utilizados na contabilidade da dívida
pública, para permitir "uma interpretação melhorada dos desdobramentos e
perspectivas fiscais". Ainda, a principal ferramenta de gerenciamento
macroeconômico no momento, acredita o FMI, deve ser a política
monetária, conduzida pelo Banco Central (BC).
As observações são
parte da avaliação anual da economia brasileira, chamada tecnicamente de
Artigo 4, conduzida pela equipe técnica e aprovada pelos diretores do
FMI. O texto, curto e sem detalhamento, é apenas um sumário do documento
produzido pela missão que discutiu com o governo brasileiro a
avaliação. O Fundo informou, em nota na página do Brasil
no site do organismo, que "as autoridades precisam de mais tempo para
avaliar a publicação do relatório". Esta prerrogativa é dos
países-membros. O Brasil passou anos sem dar aval à publicação do relatório, voltando a fazê-lo em 2012.
Ainda
que um resumo, o texto é um dos mais contundentes do FMI nos últimos
anos sobre a política fiscal. Mesmo utilizando linguagem cuidadosa,
creditando ao Brasil
esforços para solucionar todos os desafios, ele aborda várias das
preocupações que vêm sendo expostas pelos especialistas em contas
públicas nos últimos anos _ especialmente desde as manobras fiscais com
ativos da Petrobras e outras estatais, entre bancos públicos e subsidiárias do setor elétrico, e os empréstimos ao BND
Reconhecendo que o Brasil
está sendo afetado pelo cenário agitado no fronte externo, os diretores
do Fundo reafirmam, como em avaliações anteriores do Fundo, que a
economia brasileira está crescendo perto do potencial e que as
perspectivas de expansão no curto prazo estão sendo atrapalhadas por
constrangimentos do lado da oferta (por exemplo, investimentos,
infraestrutura) e incertezas na formulação de políticas. Isso está
estimulando pressão sobre a inflação e afetando a confiança dos investidores.
"Políticas
(em geral) mais rígidas ajudariam a manejar a persistente pressão sobre
os preços, a salvaguardar a confiança no arcabouço das políticas e a
estabelecer as bases para o reequilíbrio, no médio prazo, da demanda
focada em consumo. Neste contexto, os diretores saúdam o início do ciclo
de aperto monetário. E concordaram que a política monetária deve
manter-se focada na contenção das pressões inflacionárias e em ancorar
as expectativas de inflação
. Eles salientaram a necessidade de uma firme e calibrada consolidação
fiscal, ancorada numa meta de superávit primário, como o Brasil já faz há tempos", diz o resumo do FMI.
Alguns
diretores, segundo o documento, ainda veem espaço para que estímulos
fiscais sejam adotados como ferramenta anticíclica, ou seja, para ajudar
a impulsionar a economia em tempos de crescimento fraco. Porém, "de
forma geral, os diretores consideram que a política monetária deve
desempenhar o principal papel no gerenciamento da demanda agregada,
deixando a política fiscal focada na reconstrução dos colchões (espaço
de manejo)", diz o Fundo.
Neste esforço de reconstrução, diz a diretoria do FMI, o Brasil
deve estabelecer uma meta de superávit primário que conduza a dívida
pública "firmemente" a uma trajetória de queda. São bem-vistas as
iniciativas para manter a disciplina fiscal dos governos regionais, para
reduzir a rigidez do Orçamento e elevar a poupança pública e para
"reconhecer de forma mais profunda riscos associados a ativos de bancos
públicos e acordos nas concessões de infraestrutura". Mas há mais
trabalho a fazer, dizem os diretores do Fundo:
"Também recomendam a
redução gradual de empréstimos aos bancos públicos para melhorar a
dinâmica da dívida (pública). Um número de diretores também considerou
que um detalhamento maior dos conceitos de dívida pública líquida e
bruta permitiria uma interpretação melhorada dos desdobramentos e
perspectivas fiscais".
O documento não faz uma avaliação prolongada sobre a posição do Brasil diante da onda de turbulência internacional
, provocada pela expectativa do início da redução gradual das compras
mensais de títulos públicos pelo Federal Reserve (banco central
americano). O FMI limita-se a constatar que a moeda brasileira vem se
depreciando desde o ano passado e que a disparada recente na cotação do
dólar é parte "de um realinhamento maior em todos os mercados
emergentes". O câmbio
flutuante permanece, segundo o Fundo, o principal canal de
amortecimento em períodos de turbulência financeira e os diretores
"saudaram a intenção das autoridades de limitar as intervenções no câmbio à moderação de volatilidade excessiva".
O texto elogia o fortalecimento dos mecanismos de regulação e supervisão do sistema financeiro
brasileiro e destaca a solidez do sistema bancário nacional. Mas os
diretores reafirmaram alertas dos últimos anos de que as autoridades
devem manter-se vigilantes ao endividamento das famílias e à evolução do
financiamento imobiliário.
Como incentivo ao crescimento, o FMI
elogia o lançamento de programas de concessão "com regras de mercado"
para impulsionar o investimento privado e desfazer gargalos de
infraestrutura. Mas consideram que reformas estruturais ainda são
assuntos inacabados no Brasil .
"(Os
diretores) enfatizaram que esforços abrangentes para elevar a
produtividade, a competitividade e o investimento são cruciais para
aumentar o crescimento potencial. Com este fim, é importante aumentar a
poupança doméstica, reformular o mecanismo de indexação do salário
mínimo e continuar a reforma da Previdência. Outros esforços para
promover o investimento privado deveriam incluir mudanças tributárias e
melhora das condições para se fazer negócios".
Fonte: Jornal O Globo.
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