Cravado por críticas à deterioração dos indicadores fiscais e pelo temor
de piora futura nas contas do setor público, o governo da presidente
Dilma Rousseff reagiu. Decidiu, na terça feira, que não vai mais
trabalhar para a aprovação da proposta de mudança retroativa do
indexador das dívidas dos Estados e municípios com a União. O projeto
que beneficiava sobretudo o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad,
"perdeu a prioridade", explicou ontem o ministro da Fazenda, Guido
Mantega, ao Valor PRO.
O projeto de lei complementar que foi
aprovado na Câmara e tramita no Senado não será retirado do Congresso,
mas também não deve ser aprovado por que, segundo o ministro, suscitou
muitas dúvidas sobre se a proposta, com a retroatividade, estimula ou
não o aumento do endividamento dos governos subnacionais. Só a
prefeitura de São Paulo teria um alívio de R$ 24 bilhões na dívida que
hoje soma R$ 54 bilhões.
A decisão foi comunicada aos líderes dos
partidos da base aliada e das duas casas do Congresso que participaram
na terça feira de uma reunião no Palácio do Planalto, com a presidente, e
assinaram o pacto pela responsabilidade fiscal, conforme documento
proposto pelo governo federal.
A iniciativa decorreu da
necessidade de interromper a tramitação de uma série de projetos no
parlamento que representariam enormes despesas futuras para a União, os
Estados e os municípios. Algo estimado em R$ 60 bilhões.
"Não se
pode criar nenhuma nova despesa", assinalou Mantega. O pacto não tem
prazo de validade definido. "Vai durar enquanto o Executivo e o
Congresso acharem necessário" e significa que "Legislativo e Executivo
estão abraçando a mesma bandeira, que aliás sempre esteve presente, de
manter os sólidos fundamentos fiscais da economia brasileira", disse.
O
alcance desse ato, ainda que simbólico, pretendeu ser maior: uma
correção de rota na política fiscal que assegure aos agentes do mercado
que o governo de Dilma Rousseff não será negligente com o risco de o
país sofrer um rebaixamento das agências de rating.
Para Mantega,
porém, "sempre perseguimos a responsabilidade fiscal. Ela nunca deixou
de ser nosso objetivo". O que ocorre, explica, é que "quando a situação
aperta, e há momentos em que fica mais difícil conseguirmos os
resultados desejados, aí você toma medidas adicionais. Reduz a despesa
aqui, aperta alí, examina gastos que estão com crescimento atípico, como
estamos fazendo com o seguro desemprego e o abono salarial".
O
Ministério da Fazenda tem mecanismos para fechar as torneiras e impor
maior rigor nas finanças dos governos subnacionais, mediante freios ao
endividamento, explica Mantega. E isso está sendo feito, informa.
A
União, porém, não pretende voltar a compensar, com a produção de maior
superávit primário, as frustrações das metas dos Estados e municípios
como sempre fez no passado. O compromisso que o ministro assegura que o
governo central cumprirá este ano é o de um superávit de R$ 73 bilhões,
equivalente a 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB).
Se os entes da
federação conseguirem um saldo primário de 0,4% do PIB, o resultado
consolidado será de 1,9% do PIB. Eles é que determinarão o cumprimento
ou não da meta fiscal que começou o ano em 3,1% do PIB, passou para 2,3%
do PIB e agora está na dependência dos governadores e prefeitos.
"Eles
têm a responsabilidade deles e nós, a nossa. Do jeito que estava, fica
tudo como responsabilidade da União. Em 2012, se os Estados e municípios
tivessem cumprido a meta, não teríamos que colocar os recursos do Fundo
Soberano na conta", argumenta o ministro. A rigor, pelas metas de 2013,
o governo central teria que produzir um saldo primário de R$ 63 bilhões
(considerando os abatimentos previstos). O compromisso de chegar a R$
73 bilhões, segundo Mantega, já é para ajudar os entes da federação.
"Mas eles têm que se esforçar, correr atrás". Exemplo de que eles estão
mais ativos é que vários Estados estão fazendo renegociação de dívidas
tributárias (Refis) para melhorar o caixa.
A visão do ministro
para 2014 é um pouco mais rósea. Com as desonerações da folha de
salários - "que foram grandes e imprescindíveis" - as empresas começaram
a recuperar a margem de lucro que estava muito reduzida. Isso vai gerar
maior receita com impostos no ano que vem. "Sem lucro não há
investimentos. A rentabilidade é que desperta o espírito animal", diz
ele.
A Petrobras, outro exemplo, vai aumentar substancialmente a
produção de derivados. Isso não só aliviará a pressão por importações
como gerará mais receita para a União com o pagamento de impostos.
Alguma recuperação da economia mundial, melhor performance da atividade
econômica doméstica, aumento do investimento, vão ajudar o governo a
cumprir as metas fiscais para 2014 que, por enquanto, são as que estão
na proposta do orçamento.
Pela demanda por crédito do BNDES no
âmbito do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), o ministro mede
a temperatura do investimento e diz que este deve crescer entre 5% a 6%
este ano.
Ele decidiu elevar de R$ 20 bilhões para R$ 25 bilhões
o novo aporte de recursos do Tesouro Nacional no BNDES porque, diante
do anúncio de que as transferências seriam menores o próprio banco
estatal começou a fechar algumas torneiras e os bancos privados,
repassadores de crédito do BNDES, começaram a reclamar. As condições de
prazos e juros do PSI ficam inalteradas até 31 de dezembro. Para o
próximo exercício, porém, elas serão mais restritivas. A operação ainda
não foi executada, "mas eu já prometi", disse.
Fonte: Jornal Valor Econômico
|