Não fosse suficiente a credibilidade da política fiscal ter ficado
abalada devido ao uso da “contabilidade criativa” na maquiagem de
estatísticas, há rubricas de grande peso nos gastos públicos cujo
comportamento piora ainda mais o quadro.
Na terça-feira, o jornal
“O Estado de S. Paulo” revelou uma delas: o déficit da Previdência
chegou, no ano passado, a R$ 49,9 bilhões, bem acima da expectativa
oficial de o saldo no vermelho não se distanciar muito dos R$ 42,3
bilhões verificados em 2012.
Há explicações conjunturais para o
mau resultado. Entre elas, o pagamento de passivos criados por decisões
judiciais, no valor de R$ 3 bilhões.
Mas é escapismo imaginar que
questões tópicas explicam o desequilíbrio crescente da previdência do
INSS, da qual depende a grande massa dos assalariados do setor privado.
O
sistema tem a conhecida tendência estrutural ao déficit crescente, por
motivos demográficos. Como o Brasil é um dos poucos países do mundo em
que se pode obter o benefício da aposentadoria sem limite mínimo de
idade, as pessoas se retiram do mercado de trabalho ainda relativamente
jovens (54 anos, em média), enquanto a expectativa de vida, já em 74
anos, continua a subir.
O resultado é menos mão de obra ativa
contribuindo para o INSS e mais aposentados com a perspectiva de receber
o benefício por muito tempo. Não há conta previdenciária que feche.
Nas
gestões Lula, avançou-se na reforma do sistema do funcionalismo
público, concluída no governo Dilma. O problema do INSS foi apenas
atenuado pela criação do “fator previdenciário”, na Era FH, para induzir
o retardamento da aposentadoria — à medida que a expectativa de vida
sobe, precisa-se contribuir mais para conseguir o mesmo benefício ou
aumentá-lo.
Não será neste ano eleitoral que a pauta da idade
mínima da aposentadoria será enfrentada. Mas técnicos do governo, diante
da deterioração galopante do sistema, acham que alguns pontos laterais,
mas nem por isso pouco importantes, podem ser enfrentados em 2014.
Entre
eles, o cálculo e a administração do auxílio-doença — 18% dos
benefícios concedidos em um ano são deste tipo, e a meta é baixar esta
proporção para 10%.
Há muita margem de ajuste: auditorias,
controles, normas. No caso dos servidores públicos, o índice chegou a
ser 30% e caiu para 4%, diz o jornal.
Outra área onde se pode
reduzir muitos gastos é nas pensões por morte. O Brasil tem uma das mais
benevolentes legislações neste campo, a ponto de os benefícios já serem
3% do PIB. Libera-se a pensão sem se considerar, por exemplo, o número
de filhos dependentes.
Mas mesmo que seja possível executar esta agenda secundária, o próximo presidente terá de enfrentar o tema do limite de idade.
Fonte: Jornal O Globo.
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